A EVANGELIZAÇÃO COMO DOM E SERVIÇO

I-O EVANGELIZADOR E O ESPÍRITO SANTO

Ao falar do evangelizador, o Novo Testamento diz que este deve ser uma pessoa confiante e corajosa, pois ele tem consigo a mesma força que consagrou Jesus para a missão: “No decurso de uma refeição que partilhava com os discípulos, Jesus ordenou-lhes que não se afastassem de Jerusalém, mas que esperassem lá o prometido do Pai, do qual me ouvistes falar. João baptizava em água, mas vós sereis baptizados no Espírito Santo” (Act 1, 4-5).

O Espírito Santo será o guia e o mestre deles, ensinando-os e dando-lhes força para bem realizaram a obra da evangelização do mundo: “Mas o Paráclito, o Espírito que o Pai enviará em meu nome, esse é que vos ensinará tudo e há-de recordar-vos tudo o que eu disse” (Jo 14, 16).

São Paulo diz que os evangelizadores são ministros da Nova Aliança capacitados pelo Espírito Santo para o serviço do Evangelho: “Não é que sejamos capazes de realizar algo como coisa vinda de nós. A nossa capacidade vem de Deus, pois é ele que nos torna aptos para sermos ministros de uma Nova Aliança, não da letra, mas do Espírito, porque a letra mata, mas o Espírito dá vida” (2 Cor 3, 6).

A acção do evangelizador será tanto mais eficaz quanto mais este abrir o coração à novidade da Palavra e do Espírito Santo. O evangelizador é uma mediação da qual Deus precisa, mas o protagonista é o Espírito Santo. Na verdade, evangelizar é pôr Deus a falar. Tomando São Paulo como modelo, podíamos dizer que o evangelizador consciente age como se tudo dependesse dele, sabendo, no entanto, que o fundamental é obra de Deus.

Eis o que diz a Primeira Carta aos Coríntios: “Mas quem é Apolo? Quem é Paulo? Simples servos por cujo intermédio abraçastes a fé. Na verdade cada um de nós actua segundo a medida que Deus nos concedeu. Eu plantei e Apolo regou, mas foi Deus quem deu o crescimento. Isto quer dizer que nem o que planta nem o que rega é alguma coisa por si, mas só Deus é capaz de fazer crescer. O que planta e o que rega formam uma união em Cristo e cada qual receberá o prémio do seu trabalho. Nós somos, de facto, cooperadores de Deus e vós sois o campo de cultivo do Senhor” (1 Cor 3, 5-9).

São Lucas diz que Jesus tomou muito a sério a sua condição de consagrado pelo Espírito Santo: “Jesus veio a Nazaré onde se tinha criado. Segundo o seu costume, entrou em dia de sábado na sinagoga e levantou-se para ler. Entregaram-lhe o livro do profeta Isaías e, desenrolando-o, deparou com a passagem em que está escrito: “O Espírito do Senhor está sobre mim porque me ungiu para anunciar a Boa Nova aos pobres. Enviou-me a proclamar a libertação aos cativos e, aos cegos, a recuperação da vista. Enviou-me a libertar os oprimidos e a proclamar o ano da graça” (Lc 4, 18-19).

Jesus reconhecia, pois, que o seu jeito de anunciar ao Evangelho e de libertar as pessoas era obra do Espírito Santo. A fecundidade da nossa acção evangelizadora vem-nos do facto de estarmos unidos de modo orgânico a Jesus, diz o evangelho de São João: “Permanecei em mim que eu permaneço em vós. Tal como o ramo da videira não pode dar fruto por si mesmo, mas só permanecendo na videira, assim também acontecerá convosco se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira. Vós sois os ramos. Quem permanece em mim e eu nele, esse dá muito fruto, pois sem mim nada podeis fazer” (Jo 15, 4-5).

São Paulo diz que o Espírito Santo nos dá os dons necessários para realizarmos a nossa missão de evangelizadores: “Há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. Há diversidade de serviços, mas é o mesmo Senhor. Há diversos modos de agir, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos. A cada um é dada a manifestação do Espírito para proveito comum (1 Cor 12, 4-7).

O evangelizador deve ser uma pessoa humilde e reconhecer que os frutos da sua missão têm como origem a acção de Cristo ressuscitado. Por outras palavras, a nossa acção evangelizadora é uma continuação da missão de Jesus Cristo.


II-O EVANGELIZADOR É UM SERVIDOR DA PALAVRA

O evangelizador sabe que não leva Cristo às pessoas. Quando ele chega ao campo de missão, o Senhor ressuscitado já lá está disposto a actuar pelo Espírito Santo. Por outras palavras, o Senhor ressuscitado precede o apóstolo, mas não nos podemos esquecer de que Cristo Ressuscitado precisa de mediações para realizar a obra do Evangelho.

É por esta razão que São Paulo diz que nós somos o Corpo de Cristo, isto é, mediações e encontro de Cristo com o mundo. Para São Paulo o corpo é a principal mediação de encontro e comunicação. “Vós sois corpo de Cristo e seus membros, cada qual na parte que lhe toca” (1 Cor 12, 27).

Ao fazer a sua experiência Pascal, São Paulo ficou consciente de que o corpo de Cristo ressuscitado é espiritual, não físico: “Mas perguntam alguns: como ressuscitam os mortos? Com que corpo ressurgem? Insensatos! O que semeais não volta à vida se primeiro não morrer. E o que semeais não é o corpo que há-de vir, mas um simples grão de trigo, por exemplo, ou de qualquer outra espécie. É Deus que lhe dá o corpo, pois ele dá a cada semente o corpo que lhe corresponde (…). Assim também acontece com a ressurreição dos mortos: semeado corruptível, ressuscita como corpo incorruptível. Semeado na desonra, ressuscita glorioso. Semeado na fraqueza ressuscita cheio de força. Semeado corpo físico, ressuscita corpo espiritual. Na verdade há corpos terrenos e corpos espirituais” (1 Cor 15, 35-44).

O raciocínio de São Paulo é o seguinte: como o corpo do Senhor ressuscitado é espiritual, ele precisa da mediação, isto é, um corpo físico, a fim de se poder encontrar com os seres humanos. Este corpo físico, diz São Paulo, é a comunidade cristã:"Vós sois corpo de Cristo e seus membros, cada um na parte que lhe toca" (1 Cor 12, 27).

Ao evangelizar, portanto, os cristãos põem Cristo a falar, pois eles são o Corpo de Cristo com o qual fazem uma união orgânica de tipo sacramental. O baptismo no Espírito consagra e capacita os cristãos para esta tarefa. Isto quer dizer que o evangelizador se deve apresentar diante das pessoas de maneira humilde, sabendo que ao evangelizar ele também está a ser evangelizador.

Como Jesus disse aos discípulos, a grandeza e a autoridade do Apóstolo radica no serviço aos irmãos: “Jesus chamou os discípulos e disse-lhes: sabeis que os chefes das nações as governam como senhores e que os poderosos exercem sobre elas o seu poder. Não deve ser assim entre vós. Pelo contrário, quem entre vós quiser fazer-se grande, seja o vosso servo. O Filho do Homem também não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida pela Humanidade” (Mt 20, 25-28).

Os evangelizadores têm dons diferentes. Ao consagrar estes dons para a missão, o Espírito Santo faz que as suas qualidades se tornem carismas, isto é, dons em favor de todos. Deste modo, Deus torna fecunda a acção de cada crente, incorporando-a de modo harmonioso no tecido da vida comunitária (1 Cor 3, 5-9). O evangelizador deve compreender que o sucesso da sua missão está na cooperação com os irmãos e não na competição (1 Cor 3, 5-9). Por outras palavras, a força da missão do Apóstolo radica na comunhão com Cristo e os irmãos.

III-A RESISTÊNCIA DO MUNDO E A VITÓRIA DA PALAVRA
O evangelizador leva consigo uma Palavra que põe em causa o mundo corrompido que tenta impedir a emergência do Homem Novo. Por outras palavras, a Palavra de Deus anuncia um plano de libertação e felicidade para o Homem, mas também denuncia muitas estruturas sociais, políticas e económicas que se opõem ao plano salvador de Deus. Isto quer dizer que a Palavra de Deus não é neutra e, por vezes traz sofrimentos para o Apóstolo que a anuncia.

São Paulo fala-nos dos muitos sofrimentos que teve de passar para levar por diante a sua missão de anunciar o Evangelho. No entanto, ele reconhece que as perseguições e maus tratos não vencem o evangelizador, pois o Espírito Santo toma partido por ele. São Paulo diz que o facto de o evangelizador ser uma pessoa frágil é o sinal de que a força do Evangelho é obra de Deus e não do Homem.

Eis o que ele diz na Segunda Carta aos Coríntios: “Trazemos, porém, este tesouro em vasos de barro, a fim de que se veja que o nosso poder extraordinário é de Deus e não nosso. Em tudo somos atribulados, mas não esmagados. Confundidos, mas não desesperados. Somos perseguidos, mas não abandonados. Abatidos, mas não aniquilados” (2 Cor 4, 8-9).

O evangelizador encontra a resistência do mundo porque os critérios do mundo e os critérios de Cristo são opostos. Jesus preveniu os discípulos, avisando-os de que o mundo lhes faria grande oposição. Na verdade, o mundo odeia a Palavra de Deus, pois esta denuncia as suas distorções e injustiças:

“Se o mundo vos odeia, reparai que antes me odiou a mim. Se viésseis do mundo, o mundo amaria o que é seu. Mas vós não vindes do mundo, pois eu escolhi-vos do meio do mundo. É por esta razão que o mundo vos odeia. Lembrai-vos da Palavra que vos disse: o servo não é mais que o seu senhor: Se me perseguiram a mim, também vos hão-de perseguir a vós. Se cumpriram a minha palavra também hão-de cumprir a vossa” (Jo 15, 18-21).

Ao mesmo tempo que prepara os discípulos para enfrentarem perseguições, Jesus dá-lhes a garantia de que a sua missão será eficaz. A evangelização é um acto de amor que implica sacrifício. Mas o evangelizador sabe que vale a pena gastar a vida pela mesma causa que levou Jesus a gastar a sua. A primeira carta de Pedro diz que ser perseguido por causa de Cristo é um sinal claro de que pertencemos a Deus e não ao mundo.

É a prova de que somos de Cristo, o totalmente rejeitado pelo mundo. Enquanto viveu na terra, Jesus estava no mundo, mas não era do mundo, pois os seus critérios eram totalmente opostos aos do mundo como afirma o texto das bem-aventuranças.

As perseguições dos discípulos de Jesus são a confirmação de que estes pertencem a Jesus e a sua missão faz parte da missão de Jesus: “Felizes sereis quando vos insultarem e, mentindo, disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa. Exultai e alegrai-vos porque será grande a vossa recompensa no Céu. Foi também assim que trataram e perseguiram os profetas que vos precederam” (Mt 5, 11-12).

A Carta aos Efésios oferece uma série conselhos válidos para os apóstolos de todos os tempos: “Mantende-vos firmes, tendo os rins cingidos com a verdade e vesti a couraça da justiça. Tende os pés preparados para partir a anunciar o Evangelho da Paz. Acima de tudo tomai o escudo da fé com o qual podereis apagar as setas incendiadas do maligno. Ponde ainda o capacete da salvação e a espada do Espírito Santo que é a Palavra de Deus. Servi-vos de toda a espécie de orações e preces. Orai sem cessar no Espírito Santo. Vigiai e sede perseverantes, orando por todos os irmãos na fé” (Ef 6, 14-18).

É interessante ver como São Paulo utiliza uma linguagem própria de lutadores, a fim de significar que a evangelização é uma luta contra o mundo. A espada do Espírito, isto é, a Palavra de Deus, é penetrante, pois atinge o ser humano no mais íntimo do seu coração. As setas que arremessamos são as nossas preces. O escudo para nos defendermos das setas dos inimigos é a nossa fé.

São Paulo diz estar seguro de que os servidores do Evangelho sairão vencedores deste confronto com o mundo, pois eles são fortalecidos pelo Espírito de Cristo ressuscitado: “Quem poderá separar-nos do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome a nudez, o perigo, a espada? Como está escrito, por causa de ti estamos expostos à morte o dia inteiro, fomos tratados como ovelhas destinadas ao matadouro. Mas de tudo isto saímos vencedores, graças àquele que nos amou (…). Nenhuma criatura nos poderá separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, Senhor nosso” (Rm 8, 35- 39).

Do mesmo modo, a Primeira Carta de São Pedro diz que as perseguições devem ser um motivo de alegria para o evangelizador, pois são o sinal de que este é fiel à missão de Jesus Cristo. As perseguições são como o fogo que purifica o ouro e a prata (1 Pd 1, 6-7).

É quando nos sentimos frágeis que a força de Deus se faz sentir de modo mais forte diz a Carta aos Efésios: “E foi assim que a uns constituiu apóstolos, a outros, profetas, evangelistas, pastores e mestres, em ordem a preparar os santos para o serviço da edificação do corpo de Cristo. Deste modo chegaremos todos à unidade de Fé e do conhecimento do Filho de Deus, ao homem adulto, de acordo com a medida plena de Cristo. Só deste modo deixaremos de ser crianças, batidas pelas ondas e levadas por qualquer vento de doutrina, ao sabor do jogo dos homens, da astúcia que, maliciosamente, leva ao erro” (Ef 4, 9-14).

A vitória do evangelizador só pode ser adquirida com armas espirituais e não armas físicas, diz a Segunda Carta aos Coríntios (2 Cor 10, 3-5). Os evangelizadores que colocam em primeiro lugar a Palavra e a fidelidade ao Espírito podem ter a certeza de que terão a vitória assegurada. É importante estarmos preparados, diz a primeira Carta de Pedro, para dar razões da nossa esperança aos que no-las pedem (1 Pd 3, 13).

A missão para a qual o evangelizador foi escolhido é um serviço fundamental à Humanidade. O maior prémio do evangelizador reside no facto de ele, à medida que evangeliza, ser o primeiro a ser evangelizado.

Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias

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