Final da História e Vida Eterna





a) A Vida Eterna em Perspectiva Bíblicas
1- A Vida Eterna Como Dom de Deus
2- Vida Eterna e Comunhão com Deus
3- Encarnação e Vida Eterna
4- Vida Eterna e Conhecimento de Deus
5- Jesus Cristo e a Vida Eterna
6- O Espírito Santo Como Água da Vida

b) Final da História e Salvação
1- O Plano de Deus é um Projecto de Amor
2- A Nova Criação em Cristo
3- Assumidos na Comunhão Familiar de Deus
4- O Dia do Juízo
5- O Dia da Salvação

c) O Reino de Deus tem Como Lei o Amor
1- Reino de Deus e Amor Universal
2- O Reino de Deus Como Processo
3- São João e o Reino de Deus
4- Jesus e a Emergência do Reino de Deus
5- O Reino Como Comunhão Orgânica

d) Espírito Santo e o Mistério da Salvação
1- Espírito Santo no Mistério de Cristo
2- Espírito Santo e Salvação
3- A Presença do Espírito Santo em Nós
4- Espírito Santo e Humanização do Homem

e) O Céu Como Festa do Amor Total
1- A Alegria Sem Condicionamentos
2- Encontro no Espírito Santo
3- Envoltos na Ternura de Deus


a) A Vida Eterna em Perspectivas Bíblicas

1- A Vida Eterna Como Dom de Deus

Deus não é uma realidade histórica, mas as pessoas divinas estão empenhadas na história do Homem. Na sua ternura infinita Deus quis que o Humanidade tivesse parte na festa da vida eterna. Eis o que diz o evangelho de São João: “Pai, chegou a hora! Manifesta a glória do teu Filho, de modo que o teu Filho manifeste a tua glória, segundo o poder que lhe deste, a fim de ele dar a vida eterna a todos os que lhe entregaste. Esta é a vida eterna: que te conheçam a ti, Pai, como único Deus verdadeiro e a teu Filho Jesus Cristo a quem enviaste” (Jo 17, 1-3).

Podemos dizer que a vida eterna é o grande dom que Deus nos oferece em Cristo. Eis o modo como São Paulo vê o dom da vida eterna em Cristo: “Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo, em ordem à fé dos eleitos de Deus e ao conhecimento da verdade, que conduz à piedade. Assim é fortalecida a esperança na vida eterna, prometida desde os tempos antigos pelo Deus que não mente. Este mistério foi manifestado no devido tempo pela pregação da qual fui incumbido por mandato de Deus, nosso Salvador” (Tit 1, 1-3).

A vida eterna é um dom totalmente gratuito que Deus nos proporciona mediante a acção do Espírito Santo em nós: “Mas quando se manifestou a bondade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com a Humanidade, ele salvou-nos. Esta salvação não é devida às obras de justiça que tivéssemos praticado, mas sim à sua misericórdia, através de um novo nascimento e renovação mediante o Espírito Santo, que ele derramou abundantemente sobre nós por Jesus Cristo nosso Salvador. Deste modo, uma vez justificados pela sua graça, vamo-nos tornando herdeiros da vida eterna que já vivemos na esperança” (Tt 3, 4-7).


2- Vida Eterna e Comunhão com Deus

A vida eterna é a Festa da Família de Deus. O Livro do Apocalipse descreve de modo muito bonito a vida eterna como comunhão de Deus com a Humanidade: “Vi então um Novo Céu e uma Nova Terra, pois o primeiro céu e a primeira terra tinham desaparecido e o mar já não existia. E vi descer do céu, de junto de Deus, a cidade santa, a nova Jerusalém, já preparada, qual noiva adornada para o seu esposo. E ouvi uma voz potente que vinha do trono e dizia:
“Esta é a morada de deus entre os homens. Ele habitará com os seres humanos e estes serão o seu povo. Deus estará com eles e será o seu Deus, enxugando todas as lágrimas dos seus olhos. Não haverá mais morte, nem luto, nem pranto, nem dor, pois as primeiras coisas passaram”. O que estava sentado no trono disse: “Eu renovo todas as coisas!” E acrescentou: “Escreve, porque estas palavras são verdadeiras. Eu sou o Alfa e o Ómega, o Princípio e o Fim! Ao que tiver sede eu lhe darei a beber gratuitamente da nascente da Água da Vida. O que vencer receberá estas coisas como herança. Eu serei o seu Deus e ele será o meu filho!” (Apc 21, 1-7).

A vida eterna é uma dinâmica relacional e interactiva e não algo que uma pessoa possa possuir de modo isolado. Como princípio animador de relações e vínculo maternal de comunhão orgânica, o Espírito Santo é o elo da comunhão que constitui a vida eterna.

3- Encarnação e Vida Eterna

O evangelho de São João diz que a Encarnação é a fonte da vida eterna: “Aos que o receberam, aos que crêem nele, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. Estes não nasceram dos laços do sangue. Também não nasceram de um impulso da carne nem da vontade do homem, mas sim de Deus. E o Verbo fez-se carne e habitou entre nós. Nós vimos a sua glória, essa glória que ele possui como Filho unigénito do Pai, cheio de Graça e Verdade” (Jo 1, 12-14).

A vida eterna implica, pois, a nossa incorporação na Família de Deus cujo resultado é a nossa divinização. A Primeira Carta de São João diz que a dinâmica da vida eterna é o amor: “Nós sabemos que passámos da morte para a vida, porque amamos os irmãos. Quem não ama permanece na morte. Todo o que tem ódio ao seu irmão é um homicida e vós bem sabeis que nenhum homicida tem dentro de si a vida eterna” (1 Jo 3, 14-15).

A vida eterna é um dom que nos vem de Deus através de Jesus ressuscitado: “Deus deu-nos a vida eterna, e esta vida está no seu Filho. Quem tem o Filho tem a vida, quem não tem o filho não tem a vida” (1 Jo 5, 11-12).

4- Vida Eterna e Conhecimento de Deus

Deus é o Senhor da Vida Eterna. Por ser amor Deus não condena ninguém. As pessoas que vão para a morte eterna, condenam-se por sua própria decisão. No Reino de Deus todos dançam o ritmo do amor, mas cada qual com o jeito que tiver treinado agora na história. Isto quer dizer que a vida eterna atinge a sua plenitude no Reino de Deus, mas está a emergir na História. Graças ao acontecimento histórico de Jesus Cristo, a pessoa vai sendo divinizada na medida em que se humaniza.

Jesus propõe-nos um jeito novo de viver, o qual nos possibilita uma interacção nova com o Espírito Santo, condição para atingirmos o conhecimento de Deus. O evangelho de São João diz que a vida eterna consiste em conhecer a Deus: “Esta é a vida eterna: que te conheçam a ti, único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem tu enviaste” (Jo 17, 3).

Conhecer, na Bíblia, significa interagir de modo amoroso e fecundo. O conhecimento de Deus e de Jesus Cristo implica, portanto, uma comunhão orgânica, a qual confere uma nova qualidade à vida: “Tudo me foi entregue por meu Pai e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11, 27).

Conhecer Deus é, pois, interagir de modo amoroso e fecundo com as pessoas divinas. Este conhecimento não é resultado de um simples treino humano, mas algo que só pode acontecer pela acção do Espírito Santo: “Nesse mesmo instante, Jesus estremeceu de alegria sob a acção do Espírito Santo e disse: “Bendigo-te ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondestes estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelastes aos pequeninos. Sim, Pai, porque foi esta a tua vontade e o teu agrado” (Lc 10, 21).

Como este texto nos indica, o conhecimento de Deus não é uma questão teórica, mas uma experiência viva feita no Espírito Santo. A Primeira Carta de São João diz-nos que o conhecimento de Deus é uma questão de amor: “Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus. Todo aquele que ama nasceu de Deus e chega ao conhecimento de Deus. O que não ama não chegou a conhecer Deus, pois Deus á amor” (1 Jo 4, 7-8). Depois acrescenta: “A Deus nunca ninguém o viu, mas se nos amarmos, Deus permanece em nós e o seu amor chega à perfeição em nós” (1 Jo 4, 12).


5- Jesus Cristo e a Vida Eterna


A razão de isto ser assim é porque Deus é amor: “Deus é amor. Quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele” (1 Jo 4, 16). O evangelho de São João diz que Jesus revela o Pai pelo seu jeito de ser e amar: “Há tanto tempo que estou convosco e não me ficastes a conhecer, Filipe? Quem me vê, vê o Pai. Como é que ainda me dizes mostra-nos o pai” (Jo 14, 8-9).

O Espírito Santo é quem nos guia neste caminho do conhecimento de Deus. Não por nos comunicar muitos conceitos, mas por nos conduzir para atitudes de amor idênticas às de Cristo: “Fui-vos dizendo estas coisas enquanto estava convosco. Mas o Paráclito, o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, esse é que vos ensinará tudo, recordando-vos tudo o que eu vos disse” (Jo 14, 25-26).

O evangelho de São João diz que o Espírito Santo tem a tarefa de completar a missão de Jesus, conduzindo-nos para a Verdade plena, isto é, para um jeito de viver idêntico ao de Cristo: “Tenho ainda muitas coisas para vos dizer, mas não as podeis compreender por agora. Quando ele vier, o Espírito da Verdade, há-de guiar-vos para a verdade completa” (Jo 16, 12-13).

A verdade plena é o conhecimento de Deus que culmina na comunhão com Deus através de Cristo. Jesus diz que não há conhecimento de Deus que não passe pelo amor aos irmãos: “Então os justos vão responder a Jesus: “Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, ou com sede e te demos de beber? Quando te vimos peregrino e te recolhemos ou nu e te vestimos? Quando te vimos doente ou na prisão, e fomos visitar-te? Então o rei responder-lhes-à: “Em verdade em verdade vos digo: sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes” (Mt 25, 37-40).

No coração do amor humano acontece sempre a acção do Espírito Santo que optimiza esse amor. Podemos dizer que o conhecimento de Deus é uma experiência que passa pelo jeito de agir face ao amor. Isto significa que a vida eterna é algo que já está a emergir no nosso coração, graças ao modo como nos deixamos conduzir pelos apelos do amor.

6- O Espírito Santo Como Água da Vida

Jesus disse à Samaritana que o dom da Salvação acontece no interior da pessoa, graças à acção da Água Viva, isto é, o Espírito Santo. “Se conhecesses o dom que Deus tem para dar e quem é aquele que te está a pedir água, tu é que lhe pedirias e ele dar-te-ia uma Água Viva” (Jo 4, 10). O profeta Jeremias denuncia a infidelidade do povo que ousa voltar as costas a Deus que é a fonte da Água Viva.

A Carta aos Romanos diz que todos os que se deixam conduzir pelo Espírito Santo são filhos de Deus Pai e irmãos do Filho de Deus: “Todos os que se deixam guiar pelo Espírito Santo são filhos de Deus. Vós não recebestes um espírito de escravidão para andardes com medo, mas sim um Espírito de adopção graças ao qual clamamos “Abba”, papá. É o próprio Espírito que dá testemunho no nosso íntimo de que somos filhos de Deus. Se somos filhos, somos igualmente herdeiros: herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo” (Rm 8, 14-17).

São Paulo também utiliza a simbologia da Água para falar do Espírito Santo: “Todos nós fomos baptizados num só Espírito, a fim de formarmos um só corpo, tanto judeus como gregos, escravos ou livres. Todos bebemos de um mesmo Espírito” (1 Cor 12, 13). Em relação às dúvidas da Samaritana a propósito da Água Viva, Jesus diz-lhe que á Água Viva não é como a água do poço de Jacob, símbolo da Antiga aliança. A água do poço de Jacob, não mata a sede de modo definitivo: “Todo aquele que bebe desta água voltará a ter sede. Mas aquele que beber da Água que eu lhe der, nunca mais terá sede, pois esta Água converter-se-á nele em Fonte de Vida Eterna” (Jo 4, 13-14).

O profeta Ezequiel diz que o Messias vem conduzir as pessoas para a autenticidade de vida, graças à acção do Espírito Santo: “Arrancarei do vosso peito o coração de pedra e dar-vos-ei um coração de carne. Porei o meu Espírito no vosso íntimo, fazendo que sejais fiéis às minhas leis e preceitos” (Ez 36, 26-27). Na Carta aos Efésios, São Paulo convida os cristãos a não se embriagarem com vinho, mas a encher-se do Espírito Santo (Ef 5, 18).

O profeta Isaías, diz que o Espírito Santo é uma água que mata a sede e faz desabrochar a vida em abundância: “Vou derramar água sobre o que tem sede e fazer correr rios sobre a terra árida. Vou derramar o meu Espírito sobre a tua posteridade e a minha bênção sobre os teus descendentes. Estes crescerão como plantas junto das fontes e como salgueiros junto das águas correntes” (Is 44, 3-4).

São Paulo reconhece que Jesus ressuscitado iniciou os tempos da abundância do Espírito Santo. Na Carta aos Romanos ele diz que o Espírito Santo é o amor de Deus derramado nos nossos corações (Rm 5, 5). Os Actos dos Apóstolos vêem no acontecimento do Pentecostes os tempos da plenitude do Espírito anunciado pelos profetas.

Face ao entusiasmo e alegria dos apóstolos, os judeus acusavam-nos de estar embriagados. Os Apóstolos respondem dizendo que a sua exultação é a realização do oráculo do profeta Joel: “Não, estes homens não estão embriagados como imaginais, pois apenas vamos na terceira hora do dia. Mas tudo isto é a realização do que disse o profeta Joel” (Act 2, 15-16).

Na verdade, o profeta Joel anunciou os tempos messiânicos como a plenitude do grande dom do Espírito Santo: “Depois disto, derramarei o meu Espírito sobre toda a Humanidade. Os vossos filhos e as vossas filhas profetizarão e os vossos anciãos terão visões. Também derramarei o meu Espírito sobre os vossos servos e servas naqueles dias” (Jl 3, 1-2).

A vida eterna brota da dinâmica do Espírito Santo em nós, diz São Paulo na Carta aos Gálatas: “Quem semear na carne, da carne colherá a corrupção. Mas quem semear no Espírito do Espírito Santo colherá a vida eterna” (Gal 6, 9). O profeta Isaías via o Espírito Santo como a fonte da Salvação: “Cheios de alegria tirareis água das fontes da Salvação” (Is 12, 3). Graças ao facto de Deus estar a fazer história com o Homem, a Vida eterna está a emergir no nosso coração.


b) Final da História e Salvação

1- O Plano de Deus é um Projecto de Amor

A fé cristã ensina-nos que a História terá um fim e o Homem será incorporado na Família de Deus. Eis o que diz a primeira carta a Timóteo: Deus quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade (1 Tim 2, 4). No evangelho de São João, Jesus diz que ele mesmo é a porta e todo aquele que passar por esta porta entra na salvação (Jo 10, 9). A vontade do Pai que me enviou é que eu não perca nenhum daqueles que ele me deu (Jo 6, 39). Deus chamou-nos para uma vocação santa, não pelas nossas obras, mas em virtude do seu plano de salvação e pela graça (2 Tim 1, 8-9).

Quando chegar o final da História acontecerá a plenitude da Humanidade como um todo. Todos os eleitos, isto é os que têm coração para comungar com Deus e os irmãos sãos incorporados na comunhão da família de Deus. A Carta aos Efésios diz que fomos eleitos em Cristo antes da criação do mundo (Ef 1, 3-4). Isto quer dizer que Deus nos talhou para comungarmos com ele.

A Segunda Carta a Timóteo diz que as Escrituras nos comunicam a Sabedoria que conduz à Salvação pela fé em Cristo (2 Tim 3, 15). Estes textos ajudam-nos a olhar a História como um projecto com um sentido salvador. O conteúdo central do Novo Testamento é, de facto, a Boa Nova da Salvação em Cristo.

2- A Nova Criação em Cristo

Graças a Cristo e ao Espírito Santo que ele nos envia os seres humanos já são filhos e herdeiros de Deus Pai e co-herdeiros com o Filho de Deus (Rm 8, 14-17). O evangelho de São João diz que Jesus não veio para julgar o mundo mas para o salvar (Jo 12, 47). Ainda que o homem exterior se vá degradando e envelhecendo, o interior vai-se renovando diariamente pala acção do Espírito Santo (2 Cor 4, 16). Assim como a morte veio por um homem, por um homem veio a salvação que é a vida eterna (Rm 5, 12-21).

Se alguém está em Cristo é uma nova criação. Passou o que era velho. Tudo isto nos vem de Deus Pai que, em Cristo, reconciliou a Humanidade consigo não levando mais em conta os pecados dos homens (2 Cor 5, 17-19). Na verdade Deus destinou-nos para sermos seus filhos adoptivos em Cristo (Ef 1, 5). Com Cristo, portanto, seremos herdeiros (Ef 1, 9-11). Este mistério esteve oculto durante milénios, mas foi-nos revelado através do seu Filho nestes tempos que são os da plenitude (Col 1, 26). Ao chamar-nos à fé, Cristo incorporou-nos no grupo do resto fiel, o qual está livre da ira que está para vir (1 Ts 1, 10).

A nossa plenitude é a comunhão universal do Reino de Deus. Ninguém é filho de Deus de modo individual ou a título pessoal. Somos filhos porque fazemos um todo orgânico com Cristo. Somos convidados a dizer Pai-Nosso, a fim de compreendermos que Deus é nosso Pai na medida em que formos irmãos dos outros. É este o modo de ser irmão de Deus Filho e filho de Deus Pai.


3- Assumidos na Comunhão Familiar de Deus

Fomos chamados a unir-nos ao Filho, a fim de fazermos uma unidade orgânica com o Pai mediante o Espírito Santo (Jo 17, 21-23). Vista à luz da fé, a História está cheia de sentido, pois é um projecto de amor sonhado de Deus. Ao ressuscitar, Jesus introduziu a História na plenitude, isto é, na fase dos acabamentos. Os Apóstolos associavam o final da História com a Segunda vinda de Cristo.

São Paulo imaginava que o fim dos tempos estava para muito breve. Deus enviou o seu Filho, a fim de se tornar o primogénito de muitos irmãos e, deste modo, nos integrar na plenitude do Reino (Rm 8, 29). E porque Cristo ressuscitado nos introduziu na Família de Deus, todos nós já podemos proclamar “Abba”, ó Pai! (Gal 4, 4-7). As primeiras comunidades cristãs julgavam que a História estava precisamente a atingir o seu fim. Os Apóstolos pensavam que ainda estariam vivos no dia da segunda vinda de Cristo (Lc 21, 20-30).


4- O Dia do Juízo

Influenciados pela visão trágica dos apocalipses judeus, os apóstolos, após a ressurreição de Jesus, começam a associar a segunda vinda de Cristo com o dia da ira. O dia da ira significava para o judaísmo do tempo de Jesus, o dia em que Deus enviaria os seus anjos para destruir os pecadores. Pouco a pouco começam a associar o dia da ira com a vinda do Messias. Nesse dia apenas um pequeno resto, o chamado resto fiel, escaparia à destruição.

São Paulo interpretava a segunda vinda de Cristo na linha do dia da ira. Ele julgava que as comunidades cristãs como o pequeno resto fiel que escaparia à punição final ele diz o seguinte aos Tessalonicenses: “Deus não nos destinou para a ira mas para a salvação em nosso Senhor Jesus Cristo (1 Ts 5, 9).

O livro do Apocalipse vê o resto fiel constituído pelos justos do Antigo Testamento. O número dos justos da Antiga Aliança é de cento e quarenta e quatro mil. Trata-se de um múltiplo de doze que simboliza os doze patriarcas multiplicados pelos doze apóstolos. Vem depois a multidão dos cristãos vindos do paganismo e oriundos dos diversos quadrantes da terra: “Não danifiqueis a terra nem o mar nem as árvores até termos marcado com o selo a fronte dos servos do nosso Deus. Ouvi depois o número dos que foram assinalados: “cento e quarenta e quatro mil de todas as tribos de Israel (…). Depois disto apareceu uma multidão que ninguém podia contar, a qual provinha de todas as nações, povos e línguas” (Apc 7, 3-9).


5- O Dia da Salvação

Pouco a pouco, o Espírito Santo foi conduzindo as comunidades para a verdade do plano de Deus. Pouco a pouco os crentes começam a compreender que a vinda gloriosa de Jesus Cristo não será uma tragédia, mas sim a plena realização do amor salvador de Deus. Jesus vai conferir plenitude à História realizando não a destruição dos pecadores, mas a realização do juízo de Deus, o qual é um juízo de salvação, não de condenação.

O juízo de salvação consiste em que Deus não permite que se perca nada daquilo que existe de salvável na pessoa humana. Por outras palavras, o juízo final de Deus não se compara com os julgamentos dos tribunais humanos, mas sim com os julgamentos dos pais, os quais são feitos pela lei do amor.

No final da História, e com o juízo final realizado segundo a lei do amor, o Reino de Deus atingirá a sua plenitude. Nesse dia realizar-se-à a afirmação da Primeira Carta a Timóteo, a qual afirma: “A vontade de Deus é que todas as pessoas se salvem e cheguem ao pleno conhecimento da verdade” (1 Tim 2, 4). Eis o que diz a Carta a Tito: Manifestou-se a graça de Deus para salvação de todos os homens (Tt 2, 11).

Quanto à maneira de se realizar este juízo e plenitude humana não devemos imaginar uma multidão homens e mulheres reunidos em qualquer canto da terra. Na verdade esta plenitude final acontecerá no íntimo do coração das pessoas que estejam em comunhão com Deus. Eis o que diz São Lucas sobre a plenitude do Reino: “O Reino de Deus não vem de modo aparatoso, pois o Reino está dentro de cada um de vós (Lc 17, 20).

c) O Reino de Deus Tem Como Lei o Amor

1- Reino de Deus e Amor Universal

O Reino de Deus é uma comunhão de grandeza humano-divina cuja dinâmica é o amor. Quando a lei de um reino é o amor, todos reinam, pois as relações são de comunhão. Jesus é um rei que fez de nós seus irmãos e amigos: ele ensinou-nos que o Reino de Deus não é uma realidade distante. Como comunhão orgânica e dinâmica de grandeza humano-divina, o Reino de Deus começou a emergir no interior de Jesus de Nazaré, graças à dinâmica da Encarnação.

No momento da sua morte e ressurreição, Jesus Cristo entra nas coordenadas da universalidade, tornando-se presente a tudo e a todos a partir de dentro. Neste momento, o Reino de Deus passa para o interior das pessoas. Eis o que Jesus diz a este respeito no evangelho de São João: “Se alguém me tem amor guardará a minha palavra e meu Pai o amará. Então nós viremos a ele e faremos nele a nossa morada” (Jo 14, 23).

O que delimita a nossa participação na plenitude do Reino de Deus é a nossa realização espiritual como pessoas livres, conscientes, responsáveis e capazes de comunhão amorosa. Uma vez inseridos na Comunhão do Reino de Deus dançaremos eternamente o ritmo do amor com o jeito que tivermos treinado aqui na terra.


2- O Reino de Deus Como Processo

Felizes dos que sabem dar conteúdo ao seu futuro, construindo-se como pessoas no presente. Com efeito seremos assumidos e incorporados na Festa do Reino de Deus na medida em que nos tenhamos construído como pessoas capazes de relações de amor e reciprocidade comunitária. Por outro lado, a interioridade pessoal-espiritual emerge progressivamente mediante opções, atitudes e relações de amor.

Jesus tinha consciência de ser um homem a viver uma condição original face a Deus. Isto era notado pelo modo como falava da sua relação com Deus. Jesus sabia que a génese do Reino de Deus estava em processo no seu íntimo. São Lucas exprime esta consciência que Jesus tinha da sua originalidade face a Deus dizendo: “Jesus veio a Nazaré, onde se tinha criado. Segundo o seu costume, entrou em dia de sábado na sinagoga e levantou-se para ler. Entregaram-lhe o livro do profeta Isaías e, desenrolando-o, deparou com a passagem em que está escrito:
“O Espírito do Senhor está sobre mim, pois ungiu-me para anunciar a Boa Nova aos pobres. Enviou-me a proclamar a libertação aos cativos, a recuperação da vista aos cegos, a mandar em liberdade os oprimidos e a proclamar o ano da graça.” Depois, enrolou o livro, entregou-o ao responsável e sentou-se. Todos os que estavam na sinagoga tinham os olhos fixos nele. Depois, Jesus dirige-lhes a palavra, dizendo: “Cumpriu-se hoje esta passagem da Escritura que acabais de ouvir” (Lc 4, 16-21).

Os evangelhos insistem na proximidade do Reino de Deus. Eis o que diz São Marcos: “Depois de João ter sido preso, Jesus foi para a Galileia, e proclamava a Palavra de Deus, dizendo: “Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e acreditai no Evangelho” (Mc 1, 14-15).


3- São João e o Reino de Deus

No evangelho de São João, o tema central é a Hora de Jesus, isto é, o momento da sua morte e ressurreição. É este o momento da Salvação, pois o Senhor, ao ressuscitar, dá-nos a Água Viva, isto é, o Espírito Santo que faz jorrar no nosso coração rios de Vida Eterna (Jo 7, 37-39; 4, 14). Como vimos acima, enquanto Jesus vivia na História, o Reino de Deus estava a emergir no interior de Jesus. Esta emergência era a dinâmica da Encarnação, isto é, o enxerto do divino no humano a acontecer.

Esta interacção humano-divina era tanto mais forte quanto mais Jesus crescia como interioridade espiritual humana. Por outras palavras, antes da ressurreição de Jesus, o Reino de Deus, estava entre os homens. No momento da sua ressurreição, Jesus passa das coordenadas exteriores da raça, da língua, do espaço e do tempo para as coordenadas da interioridade total: equidistância a tudo e a todos.

Nesse momento, Jesus torna-se a cabeça da comunhão orgânica que incorpora a Humanidade na comunhão da Santíssima Trindade. Nesse momento, o Reino de Deus deixa de estar no meio dos homens para estar no interior das pessoas. Por outras palavras, no momento da ressurreição de Jesus Cristo, o Reino de Deus passa da face exterior para a face interior da realidade. Esta passagem do Reino para a interioridade máxima do real significa a sua universalização.

É neste momento que se dá a comunicação universal do Espírito Santo, tornando-se a fonte da Vida Eterna no coração dos seres humanos: “No último dia, o mais solene da Festa, Jesus, de pé, bradou: “Se alguém tem sede venha a mim e o que acredita em mim que sacie a sua sede! Como diz a Escritura hão-de correr do seu coração rios de água via”. Ora, Jesus disse isto, referindo-se ao Espírito Santo que iam receber os que nele cressem. Na verdade, o Espírito Santo ainda não tinha vindo por Jesus ainda não ter sido glorificado” (Jo 7, 37-39).

Jesus foi-se apercebendo gradual e progressivamente de que, com a sua morte, o Reino de Deus atingiria um alcance universal, como diz o evangelho de São João: “Nesse dia compreendereis que eu estou no meu Pai, vós em mim, e eu em vós” (Jo14, 20).


4- Jesus e a Emergência do Reino de Deus

Jesus acreditava que o Reino de Deus já estava a emergir em si e que, com a sua morte e ressurreição começaria a génese universal do Reino de Deus. Por isso, no Pai-Nosso ele ensina os discípulos a pedir ao Pai que o Reino venha e que a vontade do Pai se faça (Mt 6,9-13; Lc 11, 2-4). No início do seu evangelho, São Marcos convida as pessoas a converterem-se em virtude da proximidade do Reino de Deus. (Mc 1, 15).

E nós podemos acrescentar o seguinte: através da acção libertadora de Jesus as pessoas experimentavam a proximidade do Reino em forma de uma acção transformadora. Por outras palavras, os milagres de Jesus exprimiam a dinâmica da libertação do Reino a acontecer entre as pessoas. Na verdade, as pessoas experimentavam os efeitos libertadores da presença do Reino através da actividade de Jesus. Referindo-se ao resultado libertador da sua palavra e dos seus gestos, Jesus disse aos fariseus que o facto de ele expulsar os demónios pelo Espírito Santo é o sinal de que o Reino de Deus chegou até eles (Lc 11, 20; Mt 12, 28).

O evangelho de São João diz que o Reino de Deus é a Comunhão Universal da Humanidade com a Divindade. O Reino de Deus diz Jesus, é a morada de Deus com o Homem. Neste Reino as pessoas humanas são divinizadas mediante a incorporação na Família Divina: “Não se perturbe o vosso coração. Assim como acreditais em Deus, acreditai também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fosse eu não vos teria dito que ia preparar-vos um lugar. Quando eu tiver ido e vos tiver preparado um lugar, virei novamente a vós e hei-de levar-vos para junto de mim, a fim de que, onde eu estou vós estejais também” (Jo 14, 2-3).


5- O Reino Como Comunhão Orgânica

No Reino de Deus cada pessoa é um ponto de encontro e uma mediação para acontecer a Comunhão humano-divina. São Paulo diz que o Reino de Deus não é uma questão de comida ou bebida, mas de justiça, paz e alegria no Espírito Santo (Rm 14, 17). Como mediações de introdução na Comunhão Universal, as pessoas são uma concretização única, original e irrepetível do património da Comunhão Universal. Na verdade, o Reino de Deus é constituído apenas por pessoas que se encontram em perfeita reciprocidade amorosa. O Reino de Deus, portanto, é a esfera da Comunhão e da novidade permanente.

Na Festa da Vida Eterna os seres humanos dançam o ritmo do amor, mas cada qual com o jeito com que treinou durante a sua génese pessoal na História. Por outras palavras, os ressuscitados continuam com a identidade resultante da sua realização pessoal na história. Somos pessoas em construção. A nossa identidade espiritual é precisamente o jeito de interagir e comungar com as pessoas humanas e as divinas. É com este jeito que nós tomaremos parte na Comunhão Universal da Família de Deus. O Reino de Deus é a esfera do amor, essa dinâmica universal de bem-querer que tem como origem a pessoa e como meta a comunhão.

A universalização do Reino de Deus aconteceu com o acontecimento da morte e ressurreição de Jesus. Na verdade, Jesus Cristo venceu a morte no próprio acto de morrer. Enquanto, sobre a cruz, ia morrendo o que no homem é mortal, o imortal ia sendo glorificado e incorporado na comunhão da Santíssima Trindade. Deste modo, ao morrer o último elemento daquilo que em Jesus era mortal, o imortal, isto é, a sua interioridade espiritual, estava plenamente ressuscitada. Isto quer dizer que Cristo não esteve um só minuto sob o domínio da morte, como convinha ao Senhor da Vida! Foi assim que Cristo, ao morrer, destruiu a nossa morte e ao ressuscitar restaurou e conduziu a nossa vida à plenitude.

Deste modo o Espírito Santo realizou em Cristo a vitória sobre a morte, não apenas para si, mas também para todos nós. Foi assim que aconteceu a plenitude dos tempos, isto é, a fase da recriação e da divinização da Humanidade. Se não tivesse havido pecado, a salvação em Cristo consistiria apenas na nossa divinização, pois não era necessário restaurar o Homem distorcido pelo pecado. Neste caso teria bastado conduzir a Humanidade à sua plenitude pela assunção na comunhão da Santíssima Trindade.

Eis as palavras de São Paulo sobre a plenitude à qual Deus nos conduziu em Cristo: “Foi assim que Deus nos escolheu em Cristo, antes da fundação do mundo, a fim de sermos santos e fiéis ao amor, caminhando na sua presença. Predestinou-nos para sermos adoptados como seus filhos por meio de Jesus Cristo de acordo com a sua vontade, a fim de ser louvado e glorificado pela graça que derramou sobre nós (…). Foi este o modo como Deus nos manifestou o mistério da sua vontade e o seu plano amoroso, a fim de conduzir os tempos à sua plenitude, reunindo sob o domínio de Cristo tudo o que existe.” (Ef 1, 4-10). Podemos dizer que o Reino de Deus é a esfera da Comunhão Universal cuja dinâmica é o amor.


d) Espírito Santo e o Mistério da Salvação

1- Espírito Santo no Mistério de Cristo

Até à ressurreição de Cristo, o Espírito Santo actuava no coração dos homens à maneira de um pedagogo que interpela, ilumina e conduz. No momento da sua ressurreição, Jesus Cristo comunica-nos o Espírito Santo deforma intrínseca, isto é, fazendo dele a nascente da vida eterna nos nossos corações: “No último dia, o mais solene da festa, Jesus, de pé disse em voz alta: “Se alguém tem sede venha a mim. Quem acredita em mim que sacie a sua sede! Na verdade, do seu coração há-de brotar um rio de água viva, como diz a Escritura”. Jesus dizia isto referindo-se ao Espírito Santo que iam receber os que acreditassem nele. Na verdade, ainda não tinham recebido o Espírito Santo, pois Jesus ainda não tinha sido glorificado pela ressurreição” (Jo 7, 37-39).

O Espírito Santo é o Sangue de Cristo ressuscitado, o qual actua em nós como princípio comunicador devida divina. A carne de Jesus é o seu ser interior que, tal como o nosso, está estruturado para a comunhão orgânica com todos os seres humanos. Na verdade, o termo carne, na bíblia, significa a pessoa humana enquanto ser estruturado para as relações e fazendo um todo orgânico com toda a Humanidade.


2- Espírito Santo e Salvação

No momento da sua ressurreição, Jesus entrou nas coordenadas da Universalidade, tornando-se a cabeça da Nova Humanidade, assumindo-a na comunhão da Santíssima Trindade. Esta incorporação acontece mediante a acção do Espírito Santo que, com seu jeito maternal de amar, nos conduz ao Pai que nos acolhe como filhos e ao Filho de Deus que nos acolhe como irmãos. A Carta aos romanos diz que o Espírito Santo é o amor de Deus derramado nos nossos corações (Rm 5, 5).

Como sangue de Cristo, ele tornou-se o princípio vital que alimenta a nossa inserção na Família da Santíssima Trindade. Eis as palavras de São Paulo: “Na verdade, todos os que se deixam conduzir pelo Espírito Santo são filhos de Deus. Vós não recebestes um espírito de escravidão, mas um Espírito de adopção graças ao qual clamais Abba, ó Pai! Este mesmo Espírito dá testemunho no nosso íntimo de que realmente somos filhos de Deus. Ora, se somos filhos de Deus somos também seus herdeiros: herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo” (Rm 8, 14-17).

Na verdade, o Espírito Santo é em nós o sangue de Cristo ressuscitado que nos comunica a vida divina. Por outras palavras, é pelo Espírito Santo que Cristo vai realizando de modo gradual e progressivo a nossa glorificação, fazendo-nos participar da sua ressurreição. Dizer que o Espírito Santo é um dom significa que ele é uma pessoa cujo jeito de ser é dar-se de modo pleno e permanente.


3- A Presença do Espírito Santo em Nós

Deus é a interioridade máxima do Universo. O Espírito Santo interage connosco sempre a partir de dentro. Deus é a transcendência máxima. Isto quer dizer que a nossa interioridade espiritual e a interioridade divina não coincidem. O ponto onde termina a nossa interioridade pessoal limitada, começa a interioridade ilimitada de Deus. Deus, portanto, vem à nossa interioridade a partir de dentro.

Como podemos ver não existe distância entre a nossa interioridade espiritual e a interioridade espiritual divina. O ponto de encontro da pessoa humana com Deus acontece no nosso íntimo. A bíblia chama coração a esse ponto de encontro e comunhão orgânica com a Santíssima Trindade.
Apesar de estar tão próximo, o Espírito Santo não nos invade e nunca se nos impõe. Como é o amor de Deus derramado nossos corações, o Espírito Santo nunca se nos impõe. Está sempre connosco, mas nunca está em nosso lugar. Ele é o amor maternal de Deus a introduzir-nos constantemente na Família Divina. É também pela ternura maternal que os seres humanos são introduzidos na família humana.

A presença do Espírito Santo no nosso íntimo é extremamente dinâmica, pois ele é uma pessoa que está sempre disposto a criar laços de comunhão com Deus e os irmãos. Com seu jeito maternal de amar, o Espírito Santo vai-nos ajudando constantemente a nascer de novo, pois a nossa dimensão espiritual é uma génese. Na verdade, a pessoa humana é um ser em processo de espiritualização cujo princípio dinamizador é o Espírito Santo. Podemos dizer que a nossa dimensão espiritual emerge dentro do nosso corpo como o pintainho dentro do ovo.

4- Espírito Santo e Humanização do Homem

O Espírito Santo é o sopro que Deus insuflou no barro primordial do qual saiu Adão, como diz o Livro do Génesis: “Então o Senhor Deus formou o Homem do pó da terra e insuflou-lhe pelas narinas o sopro da vida, e o Homem transformou-se num ser vivo” (Gn 2, 7). Esta intervenção especial de Deus aconteceu com nenhum outro animal, pois os animais não são seres em processo de espiritualização. Com efeito, nenhum animal se está a realizar como pessoa livre, consciente, responsável e capaz de comunhão amorosa.

O evangelho de São João diz que temos constantemente de nascer de novo através do Espírito Santo: “Em verdade em verdade te digo: quem não nascer do Alto, não pode ver o Reino de Deus” Perguntou-lhe Nicodemos: “Como pode um homem nascer sendo velho? Porventura poderá entrar de novo no ventre de sua mãe e nascer? Jesus respondeu-lhe: “Em verdade em verdade te digo quem não nascer da Água e do Espírito Santo não pode entrar no Reino de Deus. Aquilo que nasce da carne é carne, e aquilo que nasce do Espírito é espírito” (Jo 3, 3-6).

Isto quer dizer que o Espírito Santo é o impulso que activa a dinâmica histórica da humanização cuja lei é a seguinte: “Emergência pessoal mediante relações de amor e convergência para a comunhão universal.


e) O Céu Como Festa do Amor Total

1- A Alegria Sem Condicionamentos

O Céu não é um lugar. São Paulo diz o Reino de Deus não é uma questão de comida e bebida, mas sim justiça, paz e alegria no Espírito Santo (Rm 14, 17). Por outras palavras, o Céu é uma festa que acontece no íntimo das pessoas cujo coração está aberto à comunhão. O Céu é uma Comunhão Universal constituída pelas pessoas da Santíssima Trindade, com as pessoas divinas e todas as pessoas humanas capazes de comungar com Deus e os irmãos.

A ansiedade e a angústia não têm lugar no Reino de Deus. O medo já não existe, pois as pessoas amam-se todas e o sofrimento e a morte já não têm lugar. Também não há preocupações com qualquer tipo de necessidade. De facto, no Reino de Deus ninguém se preocupa com a roupa que vai vestir, ou com os alimentos que vai comer.

No Céu o egoísmo e a inveja já não existem. A alegria das pessoas está em dar o melhor de si para que os outros sejam felizes. E como é dando que se recebe, na Comunhão da Família de Deus todos vivem em plenitude. Por outras palavras, a felicidade, no Céu, está mais em dar do que em receber. Como existe uma comunhão perfeita entre as pessoas, no Céu todos recebem na medida em que dão. Já ninguém pretende amontoar, pois ninguém pretende ter mais que os outros. Foi por esta razão que Jesus nos ensinou a orar deste modo: “Pai-Nosso que estás no Céu. Santificado seja o teu nome. Venha a nós o teu Reino. Faça-se a tua vontade, assim na Terra como no Céu” (Mt 6, 9-10).

2- Encontro no Espírito Santo

No Céu os seres humanos são todos membros da Família de Deus: Filhos em relação a Deus Pai e irmãos em relação a Deus Filho. Com seu jeito maternal de amar, o Espírito Santo é o laço que une e dinamiza as relações entre os membros da Família de Deus. O jeito de ser do Espírito Santo é actuar como laço de comunhão e princípio animador de relações e comunhão amorosa.

É esta razão pela qual São Paulo diz que todos os que se deixam conduzir pelo Espírito Santo são filhos de Deus Pai e irmãos do Filho de Deus (Rm 8, 14-16). Ninguém precisa de comprar nada, pois estamos no Reino da graça, onde tudo é dado gratuitamente e em abundância.

Todos se sentem irmãos e por isso ninguém pretende dominar ou espezinhar os outros. As pessoas sentem-se plenamente saciadas da ternura de Deus. As pessoas já não têm medo, pois a única lei é o amor. Ninguém se sente cansado ou saturado, pois o amor é a fonte da qual brota a novidade constante das relações e do encontro.


3- Envoltos na Ternura de Deus

E se ainda houver alguma memória do sofrimento desta vida, Deus passa amorosamente por todos, limpando todas as lágrimas que ainda possam existir. Depois dá-nos o beijo da felicidade, comunicando-nos a plenitude do Espírito Santo, o qual nos faz esquecer para sempre a lembrança dos sofrimentos da vida terrena.

Eis a maneira como a bíblia descreve a ternura de Deus para nós: “Eis a morada de Deus entre os homens. Ele habitará com eles e eles serão o seu povo. Deus estará com eles e será o seu Deus. Enxugará todas as lágrimas dos seus olhos e não haverá mais morte, nem luto, nem pranto, nem dor, pois as primeiras coisas passaram” (Apc 21, 3-4).

Ninguém é capaz de se sentir feliz fechando-se à comunhão amorosa. Eis a razão pela qual a felicidade está em comungar com os demais. Já ninguém sofre com a saudade dos que estão longe, pois já não há lonjura nem distância. O amor circula e difunde-se por todos os que fazem parte desta grande comunhão.

A Bíblia fala de um rio de Água Viva e resplandecente como se fosse um grande diamante a brilhar. Este rio está no centro do Paraíso e chama-se o rio da Água Viva que é o Espírito Santo. Os que têm sede entram no rio e bebem e o seu rosto fica a brilhar como o de Cristo Ressuscitado. Todos os que purificaram o coração, acolhendo a Palavra de Deus, têm direito a beber no rio da Água Viva e a comer o fruto da Árvore da Vida cujo fruto dá a vida eterna.

Todos estão saciados e ninguém voltará a morrer. Já não são precisas as estrelas, o sol ou a lua, pois a luz do Espírito de Deus ilumina todas as pessoas, como diz o Apocalipse: “O Espírito diz: “Vem! Digam também todos os que escutam a Palavra de Deus: “Vem!”. O que tem sede que se aproxime e beba gratuitamente a Água da Vida” (Apc 22, 17). Isto quer dizer que Deus nos criou para a Vida e a felicidade eterna.

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