Relações Pais-Filhos (I)




1) O Recado dos Filhos


O amadurecimento da pessoa humana realiza-se dentro de um tecido de relações onde o amor se faz sentir como uma necessidade fundamental.No interior das famílias felizes, as crianças experimentam o amor como doação gratuita dos pais entre si e dos pais em relação a elas. Esta experiência dá segurança às crianças, ajudando-as a crescer como pessoas bem amadas.

No entretecido das relações familiares surgem mensagens que são verdadeiros apelos a crescer no amor e na gratuidade da comunhão. Uma destas mensagens fundamentais é o recado dos filhos que se fará ouvir tanto melhor quanto mais os pais estiverem atentos à grandeza da sua missão como esposos e como pais. No contexto de uma família em construção, o crescimento equilibrado dos filhos sugere algumas mensagens importantes que podemos descrever mais ou menos deste modo:

Queridos pais,
Eu sei que gostais de mim e por isso não vos troco por ninguém. Fui sendo moldado de acordo com o que vós achastes ser o melhor para mim. De facto, os seres humanos começam por ser aquilo que os outros, especialmente os pais, fizeram deles. Mas também que o mais importante é o que as pessoas fazem depois com o que receberam dos outros, em especial dos pais. Eis a razão pela qual eu queria chamar a vossa atenção para algumas verdades que não podeis deixar de ter presente:

Não esqueçais que eu sou um “TU” em relação a vós. Eis a razão pela qual não deveis pretender que eu seja uma cópia de vós. Apesar de eu estar a ser moldado por vós, não esqueçais que tenho uma identidade própria. Como sabeis, cada pessoa é única, original e irrepetível. Na verdade, os seres humanos não são peças de artesanato feitas em série.

Na verdade, se pretendeis fazer de mim uma cópia de vós não me estais a amar a mim mas a vós. Pretender fazer do outro uma cópia de si próprio é matá-lo na sua essência de pessoa livre, consciente e responsável. A dignidade da pessoa consiste no facto de não nascer determinada como os animais e também no facto de não se confundir com qualquer outra. Não vos esqueçais de que em cada ser humano está a emergir a humanidade de modo único, original e irrepetível.

Queridos pais, gostava ainda de vos sugerir o seguinte: Não me deis tudo o que vos peço. Por vezes peço, apenas para saber até onde posso desfrutar. Mais que de muitas coisas, preciso de vós. Também queria pedir-vos para não me gritardes. Tenho menos admiração e respeito por vós quando me gritais.

Se me gritais ensinais-me a gritar também. Não me deis sempre ordens. Isso cria em mim uma consciência de escravo. Pedi-me coisas, a fim de eu ter ocasião de aprender a exercer a gratuidade do dom. Cumpri as vossas promessas, sejam agradáveis ou não. Se for um prémio dai-mo. Se for um castigo, procurai ser justos. Não me deis castigos injustos, pois isso marcar-me-à para toda a vida.

Por favor não me compareis com os outros. Se me fazeis sentir melhor, alguém virá a ser humilhado por causa disso. Se me fazeis sentir pior ficarei complexado para o resto da minha vida. Não estejais sempre a mudar de opinião sobre o que devo ou não fazer. Este modo de proceder desorienta-me e faz-me sentir inseguro.

Decidi-vos e mantende as vossas decisões. Deste modo eu vou compreendendo que os valores são fundamentais para a realização da pessoa. Se vos mantiverdes firmes e fieis à vossa palavra ajudais-me a compreender que a realização pessoal não é uma tarefa arbitrária. Ajudai-me a compreender que a maturidade humana e a realização pessoal não podem acontecer sem fidelidade aos valores fundamentais.

Não me substituais. Agi de maneira a que eu aprenda a valer-me por mim. Não façais as coisas que eu já posso fazer e não me obrigueis a fazer aquelas para as quais ainda não estou preparado. Se me substituis estais a retardar a chegada da minha maturidade. Não digais mentiras na minha frente e nunca me peçais para mentir em vosso nome. Mesmo que seja para vos libertardes de uma dificuldade. Procedendo assim, estais a fazer com que eu perca a fé e a confiança em vós. Além disso, estais a ensinar-me a ser mentiroso.

Quando eu fizer algo de errado, não mencioneis esse facto muitas vezes, nem insistais demasiado para que eu diga as razões de tal procedimento. Por vezes nem eu próprio conheço as razões que me levaram a realizar certas coisas erradas. Além disso tenho muita vergonha de confessar os meus erros.

Quando te tiveres enganado em algo, reconhece-o. Podes ter a certeza de que, deste modo, crescerá muito a minha admiração e apreço por ti. Além disso, procedendo deste modo, estais a ensinar-me a reconhecer e admitir os meus erros.

Tratai-me pelo menos com a mesma cordialidade e ternura com que tratais os vossos amigos. Pelo facto de sermos membros de uma família não quer dizer que não devamos ser amigos. Não me peçais para fazer coisas que vós não fazeis. Eu aprendo a fazer o que vós fazeis, mesmo que não mo digais. Mas nunca aprenderei a fazer o que dizeis se vós mesmo o não fizerdes.

Quando vos aperceberdes de que tenho necessidade de te contar um problema nunca me digais que não tendes tempo para tolices. Mesmo que os meus problemas vos pareçam insignificantes, deveis compreender que, para mim, são muito importantes, pois ainda não tive tempo para aprender a gerir a vida como um adulto. Eu sei que, por vezes, estais cansados, mas eu preciso muito de vós.

Podeis ter a certeza de que sois muito importantes para mim. Por favor dizei-me que gostais de mim, embora isso mesmo que isso vos pareça desnecessário. Usai de paciência para comigo. As vossas decisões e atitudes têm como base um conjunto de experiências que eu ainda não tenho. Dai-me atenção. É fundamental para mim sentir-me tomado a sério. Na medida em que possas gasta tempo comigo em casa.

O aspecto mais nobre da vossa missão maternal ou paternal é possibilitar-me uma estruturação equilibrada. É este o caminho para eu poder realizar-me e ser válido para Humanidade. Se quereis que eu venha a ser um bom cristão convida-me a ler e partilhar alguns textos da Bíblia, a fim de eu começar a familiarizar-me com a Palavra de Deus. Também me podíeis ensinar a falar com Deus com a mesma confiança com que um amigo fala com outro amigo. Não me obrigueis a fazer muitas rezas repetitivas, pois essas coisas aborrecem-me, ao ponto de me afastarem mais de Deus. Se me ensinais a falar familiarmente com Deus estais a abrir a minha mente e o meu coração para os valores do espírito e para os horizontes da Fé.

Elogiai-me quando faço algo de bom. Os vossos elogios estimulam-me e dão-me força para fazer bem as coisas. Esforçai-vos para que a nossa casa seja um lar onde habita há alegria e amor. Num lar assim os filhos não sentem tanta necessidade de sair. Ensinai-me a olhar as coisas pelo lado positivo. O negativismo gera opressão e tristeza no meu coração, coisas que me tiram vontade de me esforçar. Procurai conhecer-me bem, a fim de melhor me ajudardes a corrigir as minhas tendências negativas e destrutivas.

Queria dizer-vos, queridos pais, que a maneira mais perfeita de me amardes é amar-vos muito como casal. Os vossos comportamentos negativos reflectem-se em mim, estruturando-me de modo distorcido. Eu sei que, devido à minha pouca experiência, faço muitas coisas erradas. Por isso vos peço para serdes compreensivos e tolerantes para comigo. Quando sois compreensivos para comigo, estais a ensinar-me a ser compreensivo para vós e para as outras pessoas. Quando me perdoais eu aprendo o grande valor do perdão.

Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias

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