Construíndo a Família Cristã (II)


c) A Igual Dignidade do Homem e da Mulher

A Humanidade é um rosto com duas faces: a face masculina e a face feminina. Isto quer dizer que todos nós somos seres sexuados. De facto, as nossas relações são todas sexuadas, isto é, diferentes consoante a condição sexual das pessoas com as quais nos relacionemos. Diferente, neste contexto, não significa ser melhor ou pior, mas apenas diferenciadas.

É importante termos consciência deste facto e assumi-lo, a fim de melhor nos aceitarmos e fazer que as nossas relações sejam naturais. Este é o modo de estarmos bem inseridos no convívio com as pessoas e darmos o melhor para a humanização da sociedade. A Humanidade está a emergir no concreto de pessoas humanas que se realizam como homens ou mulheres. Isto quer dizer que estamos talhados para o encontro e a comunhão com o diferente.

Deus é uma comunidade amorosa de três pessoas. Isto significa que Deus, ao criar o Homem à Sua imagem e semelhança, não podia deixar de o criar como um ser talhado para as relações de amor e comunhão. Estamos, pois talhados para o encontro. Podemos dizer que uma pessoa sozinha não é uma pessoa em estado plenitude.  Na verdade, a pessoa só se conhece e possui plenamente no face a face com os outros.

Como seres sexuados, as pessoas humanas estão estruturadas para a relação de comunhão de diferenças. Eis as palavras do Livro do Génesis ao falar da criação do Homem: “Deus criou o Homem à Sua imagem e semelhança, varão e mulher os criou” (Gin 1, 27). A relação do pai com a filha é diferente da relação do pai com o filho.

Diferente, aqui, não significa melhor ou pior, mas simplesmente que interagimos constantemente como seres sexuados. O mesmo se passa com a relação da mãe com o filho ou a filha. O varão e a mulher são absolutamente iguais em dignidade, apesar de serem distintos e diferenciados. Ao criar a mulher, Deus está a fazer emergir o amor em ondas de doação muito especial no que se refere à ternura.

Ao criar o Homem, Deus faz emergir o amor em ondas de bem-querer, coragem e firmeza. A Face feminina confere ao amor sobretudo um colorido de tolerância e perdão. A face masculina, por seu lado, confere ao amor a firmeza capaz de significar há coisas que não podem ser postas em causa. Criando a mulher, Deus demonstrou entender de ternura, pois o coração maternal é um manancial extraordinário de ternura.  Criando o varão, Deus demonstrou ser o Deus da Aliança, a qual assenta na firmeza e na autoridade da Palavra.

A Humanidade, portanto, está a emergir e a fluir como um rio com duas margens. As margens deste rio fazem as águas orientar-se no sentido desse Oceano Infinito que é a Comunhão da Santíssima Trindade. O nosso corpo é uma mediação básica para acontecer o encontro com os outros. O simbolismo da nossa realidade corporal indica que estamos talhados para a comunicação e o face a face. Na verdade, ninguém vê directamente o seu rosto, mas apenas o rosto dos outros.

A pessoa que pretende anular esta dimensão básica da abertura ao outro, está a estruturar-se de modo neurótico, podendo malograr a sua realização pessoal de homem ou mulher. A nível espiritual acontece exactamente a mesma coisa: a plenitude da pessoa não está em si, mas na reciprocidade da comunhão. Reduzida a si, a pessoa está em estado de malogro e perdição.

A família humana realizada e feliz é o sacramento da Família de Deus, a qual é a plenitude da família humana. O Céu é a comunhão Universal da Família de Deus cujo coração é a comunhão amorosa da Santíssima Trindade.

Ao criar o Homem, Deus fê-lo através de uma intervenção especial: depois de preparar o barro orgânico que é a dimensão biológica do Homem, soprou-lhe o Sopro de Vida, isto é, o Espírito Santo (Gin 2, 7). Nesse momento, o ser humano tornou-se barro com coração, isto é, um ser com interioridade espiritual e capaz de amar.

Barro com coração é o marido que se esforça para que não falte o essencial lá em casa.
Barro com coração é a esposa que se esforça para que não falte o apoio afectivo ao marido.
Barro com coração é a mãe que, após um dia de trabalho, ainda arranja tempo para preparar uns miminhos para os filhos.
Barro com coração é o jovem que é capaz de correr riscos para defender os valores que reconhece como essenciais, mesmo que à sua volta esses valores sejam desprezados.

Barro com coração é a jovem que procura agir de acordo com o que lhe parece certo e justo.
Barro com coração é o adolescente capaz de ser diferente, mesmo que isso, por vezes, o torne menos popular.
Barro com coração é a pessoa humana que procura tratar os outros como deseja ser tratado por eles.
Barro com coração é a pessoa que decide falar com alguém que lhe parece estar muito necessitado de desabafar.
Barro com coração é o jovem consciente que se mantém firme nas suas opiniões e não anda simplesmente ao sabor das opiniões dos outros.

Ao criar o Homem, diz a Bíblia, Deus criou-os varão e mulher. O Livro do Génesis diz que Adão começou logo a conviver pacificamente com os animais. Mas Adão não falava. Foi então que Deus decidiu dar-lha uma companheira igual. Ao ver Eva, Adão deu um grito de alegria e começou a falar. Eis as palavras do Livro do Génesis: “O Senhor Deus disse: “Não é conveniente que o homem esteja só. Vamos dar-lhe um auxiliar semelhante a ele” (Gn 2, 18-19).

Em seguida, o Livro Génesis descreve as palavras de exultação de Adão ao ver Eva: “Então o homem exclamou: Este é realmente o osso dos meus ossos, a carne da minha carne. Chamar-se à mulher, pois foi tirada do homem. Eis o motivo pelo qual o homem deixará pai e mãe para se unir à sua mulher e os dois farão uma só carne” (Gn 2, 23-24).
O homem e a mulher de tal modo estão talhados um para o outro que é como se a mulher fosse arrancada do peito do homem e este arrancado do seio da mulher. Como seres semelhantes a Deus, o homem e a mulher são seres criadores. Na verdade eles são capazes de fazer que o novo aconteça e que surjam realidades e projectos que antes não existiam.

Como seres criadores, o homem e a mulher são realmente cooperadores de Deus na obra da Criação. Eis a razão pela qual Deus encontra condições para fazer uma aliança com eles. Mas Deus não criou o homem e a mulher como seres acabados. Para se realizarem como pessoas livres, conscientes e responsáveis, o homem e a mulher têm de tomar parte na sua realização.

De facto, Deus não mandou Adão realizar-se como um sujeito isolado, mas como uma união orgânica. Eis as palavras do Génesis: “Abençoando-os, Deus disse: “crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai a Terra” (Gin 1, 28) ”. Portanto, é como varão e mulher que Deus os chama a colaborar na obra da Criação.

É ao varão e à mulher que Deus chama formarem uma só carne, isto é, uma união orgânica, dinâmica e fecunda. É ao homem e à mulher que Deus convida para que construam famílias felizes, a fim de podermos ter sociedades mais humanizadas. É ao homem e à mulher que Deus convida a cuidar desta terra que ele nos deus como morada.

Se não tomarmos a sério esta missão que Deus nos deu, a terra converter-se-á em lugar de morte, em vez de ser o jardim maravilhoso onde brota a vida. Na verdade, já quase não temos rios de água limpa. O ar que respiramos é cada vez mais um ar de má qualidade. Já começamos a abrir buracos na camada de ozone correndo o risco de tornara a vida inviável sobre a terra.

O homem e a mulher estão convidados a ser bons colaboradores na nobre tarefa de construir uma sociedade mais justa e fraterna. Como sabemos, a pessoa faz-se, fazendo. Realizamo-nos, concretizando planos, projectos e sonhos. Esta tarefa é tanto para homens como para mulheres. De facto, é nesta possibilidade de nos construirmos em colaboração fraterna que está a nossa grandeza e dignidade.
Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias

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