Caminhos de Maturidade Humana e Cristã




a) Maturidade e Relações Humanas
b) Atitudes Geradoras de Maturidade
c) Passos Para a Maturidade do Amor
d) Maturidade e Atitudes Responsáveis
e) Esperança Cristã e Maturidade
f) Comunidade e Maturidade de Fé



a) Maturidade e Relações Humanas

Quando nos relacionamos significativamente com os outros, estamos a estruturar-nos como pessoas. As relações humanas, além de serem um factor de estruturação pessoal são também criadoras de reciprocidade interpessoal. Assim, sem nos apercebermos disso, começamos a ver pouco a pouco o outro do mesmo modo como ele nos vê a nós, isto é, tendemos a tratar o outro do mesmo modo como ele nos trata a nós. De facto, as pessoas estão talhadas para a reciprocidade e a comunhão. Conhecem-se na medida em que interagem com as outras pessoas. É através das relações que encontramos a nossa pessoa e a pessoa dos outros.

Mas a dinâmica das relações humanas vai ainda mais longe, pois não só nos estruturamos psiquicamente, mas a nossa realidade espiritual emerge através das relações de amor e comunhão. Por outras palavras, as relações são a dinâmica interactiva que faz emergir e crescer a pessoa na sua identidade espiritual. Isto quer dizer que a pessoa, por estar talhada para a reciprocidade e a comunhão, só pode emergir e possuir-se através das relações com os outros. É este o mistério do Homem a emergir e a encontrar a sua plenitude através do encontro com os outros.

Mas as relações só têm este poder de fazer emergir e configurar a identidade pessoal se tiverem a densidade do amor. A densidade do amor de uma pessoa revela-se nas suas relações com os outros. Como sabemos, as pessoas não são evidentes na sua realidade mais profunda, mas revelam-se através das relações. Quando as relações humanas são fundamentadas no egoísmo, as pessoas encontram-se como seres separados e competitivos, enroscando-se cada qual para seu lado. A situação de inferno é o estado da pessoa que decidiu opor-se de modo sistemático e incondicional às relações de amor. Na situação de inferno a pessoa não tem ninguém que lhe diga: “Gosto de ti. Sem ti eu era mais pobre. Dá-me a tua mão e vamos fazer uma festa”. Nas relações de amor, pelo contrário, temos duas pessoas que procuram olhar para além da sua condição de ser único, original e irrepetível para descobrir a unidade orgânica e dinâmica que constitui a base da comunhão que as liga.
Como sabemos, a Humanidade não existe em abstracto, nem cai das nuvens. Na verdade, cada pessoa é uma concretização da única Humanidade que existe. Por outras palavras, a Humanidade emerge no concreto de cada pessoa de modo único, original, irrepetível e capaz de reciprocidade amorosa. Devido a esta capacidade de amar e comungar, a pessoa, na medida em que emerge, converge para a comunhão universal. Estamos, pois, perante o mistério da pessoa humana, este ser que apenas se pode encontrar e possuir na comunhão com os outros. Fomos talhados por Deus à sua imagem e semelhança. Isto quer dizer que nos enganamos quando temos medo da comunhão fraterna.

Por vezes pensamos que, introduzindo-nos na dinâmica da comunhão, podemos perder a nossa grandeza acabando por nos enroscar na pequenez do nosso ser isolado. O isolamento condiciona a nossa capacidade de nos possuir e encontrar em profundidade. De facto, a pessoa só é verdadeiramente grande na comunhão, pois a plenitude da pessoa não está em si, mas na reciprocidade da comunhão.

É através das relações que nós nos humanizamos. De facto, ninguém é capaz de ser bom, por exemplo, antes de alguém ter sido bom para ele. Do mesmo modo, uma pessoa que tenha sido muito marcada pela maldade dos outros torna-se azeda e agressiva. Normalmente está sempre numa atitude de defesa. A bondade precisa de uma calda de amor para emergir e se fortalecer. O amor é uma dinâmica de bem-querer que tem como origem a pessoa e como meta a comunhão.

Um dos principais frutos da humanização da pessoa é a bondade e a capacidade de amar. Quando dizemos que determinada pessoa é muito humana, no fundo estamos a dizer que é uma pessoa boa e capaz de amar os demais. Humanização, realização pessoal e bondade são aspectos interrelacionados. A pessoa vai-se humanizando de modo gradual e progressivo.

Com efeito, somos seres em construção histórica. Eis a razão pela qual a pessoa, para se dizer, tem de contar uma história. Eis a razão pela qual, ao querer-nos comunicar em profundidade sentimos necessidade de contar uma história, isto é, a nossa história. A força que estrutura e faz avançar a realização pessoal é o amor. É por esta a razão que o mal amado emerge como pessoa mal estruturada e condicionada nas possibilidades de uma realização com sucesso.

Nascemos com um leque de talentos que são a condição básica da nossa realização pessoal. Como sabemos, ninguém é herói por ter recebido muitos talentos, do mesmo modo que ninguém é culpado por receber um feixe das capacidades limitado. Com a emergência do Homem, a vida deu um salto para o nível espiritual, o qual é interior, definitivo e eterno. Com o aparecimento da vida pessoal-espiritual surgiu na marcha da evolução a capacidade de amar. Isto quer dizer que a vida espiritual humana emerge no interior do provisório e do mortal. O nosso ser espiritual brota gradual e progressivamente dentro do nosso ser exterior como o pintainho dentro do ovo. Por outras palavras, dentro do nosso ser individual emerge o nosso ser pessoal cuja identidade é espiritual. Com o aparecimento da vida espiritual sobre a terra surge a vida que vence o vazio da morte.

Com a vida pessoal a Criação torna-se proporcional ao Criador. Na verdade, a Divindade é pessoas em relações e a Humanidade também. Eis a razão pela qual, com o aparecimento da Humanidade surge a possibilidade da Encarnação, isto é, da interacção orgânica e dinâmica entre as pessoas divinas e as humanas. É verdade que as pessoas humanas não são iguais às pessoas divinas, mas são-lhe proporcionais, pois pode acontecer interacção e comunhão orgânica entre a Humanidade e Divindade.

Deus talhou a humanidade para a bondade, condição para acontecer comunhão com a Divindade. Ao amar os outros, o ser humano emerge como pessoa e possibilita a realização das outras pessoas. Podemos dizer que os seres humanos que gastam a vida pelas causas do amor merecem uma estátua, isto é, um reconhecimento por parte da Humanidade. Foram capazes de se estruturar como pessoas e ajudaram os outros neste parto difícil da emergência pessoal-espiritual.

Como sabemos, ninguém é capaz de amar antes de ter sido amado. Isto quer dizer que a pessoa, ao amar os outros, está a ser fiel ao amor com que foi amada. A lei do amor pode ser equacionada assim: O amor dos outros capacita-nos para amar. Por seu lado, as pessoas mal amadas ficam a amar mal, isto é, com bloqueios, condicionamentos e tropeções. Estas pessoas são vítimas, não culpadas.

Como bem sabemos, o amor dos outros faz-nos sentir aceites, valorizados e tomados a sério. Isto faz crescer em nós a auto estima, potenciando as nossas capacidades de criatividade e realização. Com efeito, quando sentimos que os outros nos valorizam, gostamos de partilhar o que fazemos e sentimo-nos capazes de ir mais longe. O amor dos outros optimiza as nossas capacidades para assumirmos papéis e tarefas no interior da vida familiar e na sociedade. E Deus, sem nos substituir, torna-se presente! De facto, no coração do amor humano acontece sempre o Espírito Santo, a ternura maternal de Deus que nos introduz no próprio diálogo amoroso da Santíssima Trindade (Ga 4, 4-7; Rm 8, 14-17).

O amor e a comunhão humana, portanto, são ponto de encontro com o amor e a comunhão com Deus. Emergir como pessoa é adquirir a matéria-prima que Deus acolhe e assume na própria comunhão divina. A fraternidade humana, portanto, encontra a sua plenitude na Comunhão Divina. A pessoa emerge como ser único, original e irrepetível. À medida em que se realiza, a pessoa oferece à comunhão humana universal a novidade de uma realização que nunca existiu e nunca mais voltará a existir. Isto quer dizer que uma pessoa nunca está a mais, pois ninguém é uma cópia de outro no encontro da comunhão universal.

Por outro lado, sempre que nos recusamos a amar uma pessoa estamos a impedi-la de desabrochar nessa novidade que nunca mais poderá acontecer. É por esta razão que o pecado é sempre uma oposição ao amor. Procedendo deste modo, a pessoa está a bloquear a sua humanização e a humanização dos outros. A nossa vocação fundamental, portanto, consiste em responder às propostas que o amor nos faz no concreto do nosso dia a dia. Portanto, pecamos contra a Humanidade sempre que de modo livre e responsável bloqueamos a nossa humanização ou a humanização daqueles que se cruzam connosco na nossa vida.

A nossa consciência é o altifalante através do qual o Espírito Santo nos convida a amar os irmãos no concreto dos acontecimentos do dia a dia. O amor é, pois, o único caminho para as pessoas provocarem o nascimento da Humanidade nelas e nas que vivem a seu lado. Por ser uma dinâmica de bem-querer que tem como origem a pessoa e como meta a comunhão, o amor depende sempre de nós. Ninguém é capaz de nos obrigar a amar. Amamos quando elegemos o outro como nosso próximo. Amar não só implica fazer bem aos outros, mas também acolher os seus gestos de solidariedade e fraternidade dos outros em relação a nós. A perfeição do amor não acontece num amor unidireccional, mas na reciprocidade da comunhão.

O amor é a única dinâmica interactiva que conduz à Comunhão Orgânica Universal. A alegria é o primeiro fruto da fidelidade ao amor. São Paulo diz que a alegria emerge no coração dos que se abrem aos outros como fruto do Espírito Santo que está em nós e connosco, mas nunca em nosso lugar (Ga 5, 22) O ser humano que vai dando o melhor de si no sentido do amor, sente-se feliz e realizado, isto é, contente por ser quem é. No coração das pessoas que amam não há lugar para esse azedume que aperta o coração quando o bem acontece aos outros. A inveja é tanto mais forte quanto mais frustrada, isto é, menos realizada, for uma pessoa. Por detrás desta frustração, normalmente há profundas cicatrizes provocadas pelas recusas de amor de outros. As pessoas que se humanizam mediante a vivência do amor são peritas na arte de imprimir o sentido e o sabor da alegria e da festa no tecido das relações humanas.


b) Atitudes geradoras de Maturidade

Para serem felizes, as pessoas precisam de se sentir aceites e amadas assim como são. Com efeito precisamos dos outros para encontrarmos a nossa plena realização, pois a plenitude da pessoa não está em si, mas na reciprocidade da comunhão com os outros. Reduzida a si, a pessoa está em estado de fracasso e malogro total. O estado de inferno não é mais que a pessoa enredada em si mesma e, portanto, privada da comunhão com as demais pessoas humanas e as divinas.

Na verdade, a pessoa emerge e estrutura-se em contexto relacional de amor. Por outras palavras, é apenas em contexto de amor e comunhão que a pessoa se pode encontrar e possuir de modo pleno. Os seres humanos começam por ser um leque de possibilidades recebidas dos demais. Na verdade, as pessoas não são ilhas. Por isso, aquelas que fecham o coração à dinâmica da salvação, isto é, à reciprocidade do amor e da comunhão se encontram em estado de malogro total. Além disso, ao fecharem as portas às relações de amor com os outros não têm a veste necessária para participar no banquete da comunhão universal com Cristo.

Humanizar, portanto, é emergir e robustecer-se como pessoa, ao mesmo tempo que converge para a comunhão universal. Por outras palavras, a experiência das relações e da vida partilhada é fundamental para a pessoa se sentir equilibrada e feliz. Isto quer dizer que a fraternidade e o amor são a calda própria para o crescimento e amadurecimento da pessoa humana.

Eis alguns aspectos importantes para melhorarmos a nossa capacidade e aptidão de nos realizarmos em relações fraternos.
*Tentarmos compreender o outro na sua realidade mais profunda.
*Treinarmo-nos na arte de facilitar a realização dos outros, aceitando as suas diferenças, pois a pessoa não consegue realizar-se de modo satisfatório se os outros rejeitam ou impedem a emergência da nossa originalidade e unicidade pessoal.
*Tomar consciência de que não pode haver crescimento em maturidade sem nos dispormos a aceitar o outro por ser o que é e não por fazer o que eu quero que ele faça.
*Aprender a confiar realmente nos outros e a agir de modo a merecer a sua confiança.

*Estar atento ao que os outros fazem e valorizar as suas realizações. Por outras palavras, aprender a reconhecer as coisas boas que os outros fazem e felicitá-los por isso.
*Estar atento às crises de crescimento das pessoas com quem vivemos e tentar ajudá-las a ultrapassar essas mesmas crises. Na verdade, não há crescimento sem crises.
*Nas conversas e convívios procuremos utilizar palavras que exprimam esperança, rejeitando as conversas pessimistas e negativas.
*Tentar não dar guarida no nosso coração aos sentimentos negativos como ressentimentos ou planos de vingança.

*Procuremos estar atentos para que as nossas relações com os outros se processem numa linha de verdade e autenticidade.
*Cultivemos o sentido de pertença em relação à família ou aos grupos dos quais fazemos parte.
*Tentemos conhecer as qualidades dos outros e as próprias e compreender que o bem que os outros fazem não deixa de o ser só porque não foi feito por nós.
*Procuremos compreender e aceitar a história das outras pessoas, a fim de sermos capazes de as aceitar e compreender.
*Lembremo-nos com frequência de que os outros são um dom de Deus para nós, pois são mediações fundamentais para a nossa realização pessoal.

*Não nos esqueçamos de que seremos nós com os outros que faremos parte da Família de Deus, a qual não assenta nos laços do sangue mas sim numa comunhão orgânica animada pelo Espírito Santo.
*No contexto da nossa família ou da nossa comunidade de Fé procuremos estar abertos a novas formas de caminhar em grupo, desde que haja objectivos claros e elaborados por todos.
* Procuremos ser conscientes de que ninguém é bom em tudo. Eis a razão pela qual o Espírito Santo suscite nas comunidades uma grande diversidade de talentos e carismas, capacidades e ministérios.

*Deixemos que os outros sejam iguais a si mesmos, pois este é a maneira mais plena de amar. Na verdade, cada pessoa é única, original e irrepetível. Amar uma pessoa, portanto, implica permitir que a sua novidade de ser único, original e irrepetível possa emergir. Não nos esqueçamos de que é uma sorte encontrar na vida pessoas livres, conscientes e responsáveis. Estas pessoas são mediações muito especiais de Deus para a realização e felicidade dos outros. Estas pessoas vivem o amor como a arte de eleger o outro como alvo de bem-querer, aceitá-lo e valorizá-lo, apesar de ser diferente de nós.

*Assim como os outros não são a nossa medida, também nós não temos o direito de pretender ser a medida dos outros.
* Procuremos avivar a consciência de que estamos a caminhar para a comunhão universal, a qual assenta na convergência das diferenças e não numa fusão de seres reduzidas a meras cópias uns dos outros.
*Avivemos com frequência a nossa esperança, lembrando-nos de que estamos a caminhar para a plenitude do amor que é a Comunhão Universal. Na verdade, o amor é uma dinâmica de bem-querer que tem como origem a pessoa e como meta a comunhão.

*Os seres humanos que têm a sorte de conviver com pessoas de grande maturidade emergem como plantas em jardim bem cultivado e irrigado. Procuremos ser assim para os outros e eles darão muitas graças a Deus por nos terem encontrado na vida.
*Procuremos ser pessoas que põem o amor e a fraternidade em primeiro plano, não marginalizam nem provocando o aparecimento de pessoas desenquadradas ou marginalizadas. Podem os ter a certeza de que, deste modo, muitas pessoas nos procurarão, olhando-nos nos olhos com muita alegria e gratidão.

*Podemos estar seguros que, na medida em que formos crescendo em maturidade, mais profunda e transparente será a nossa alegria, e o nosso sorriso terá mais sabor a verdade e a lealdade. Ao descobrirem em nós esta riqueza humana, as pessoas sentem-se encantadas e compreendem é disto que os seres humanos estão famintos. Na verdade, o ser humano está talhado para a comunhão universal.

*Tenhamos sempre presente de que as pessoas amadurecidas não são pretensiosas ou arrogantes. Estas pessoas, apesar de possuírem um elevado nível de maturidade, têm consciência plena de serem pessoas em construção. Eis a razão pela qual estas pessoas não estagnam na caminhada da sua realização pessoal.
*Quanto mais crescemos em maturidade pessoas, mais consciente nos tornamos do que ainda nos falta para atingirmos a plenitude do amor.
*Quanto mais amadurecidos formos mais crescem em nós os horizontes da fraternidade universal, a qual ultrapassa os horizontes estreitos das raças, das línguas, das nacionalidades, das culturas ou da condição sexual.

*O crescimento em maturidade leva as pessoas a considerar-se cada vez mais membros de uma Família Humana Universal. A sua Fé faz-lhes ver que a Família de Deus não assenta nos laços do sangue, mas sim na acção do Espírito Santo que, no interior de cada ser humano, faz dele filho de Deus Pai e irmão de Deus Filho (Rm 8, 14-17). A fraternidade humana, de facto, assenta no próprio plano de Deus que nos criou à sua imagem, a fim de nos acolher amorosamente como membros da sua Família.

São Paulo diz que o Espírito Santo é o amor de Deus derramado nos nossos corações (Rm 5, 5). O evangelho de São João, querendo afirmar a união orgânica da Humanidade com Deus, diz que Jesus Cristo é a cepa da videira e nós os ramos (Jo 15, 1-7). A seiva que vem da cepa para os ramos e os torna fecundos é o Espírito Santo.


c) Passos Para a Maturidade do Amor

O amor é uma dinâmica de bem-querer que tem como origem a pessoa e como meta a comunhão. O amor acontece sempre em relações geradoras de liberdade e criatividade. Dizer que o amor realiza significa dizer que a pessoa, na medida em que ama, realiza.

Eis algumas atitudes que exprimem a força que o amor tem para estruturar a pessoa e gerar comunhão:
*O amor modela e capacita o coração para o dom e a gratuidade.
*Aceita os defeitos do outro, apesar disso exigir renúncia e sacrifício.
*Sublinha as qualidades do outro e congratula-te com os seus sucessos.
*Não está sempre a exigir disponibilidade da parte do outro, mas procura estar disponível quando este precisa de si.
*Quando dá uma opinião ou aconselha alguém procura comunicar sempre o melhor da sua experiência e do seu saber. O egoísmo, pelo contrário, leva a pessoa a reservar sempre o melhor para si.

*Rejubila com os sucessos do outro como se de sucessos próprios se tratasse. A pessoa egoísta, pelo contrário, tende a ver sempre no sucesso do outro um mal para si.
*O jeito de se dar da pessoa que ama é de tal modo discreto e gratuito que o outro não se apercebe do sacrifício que, muitas vezes, está a ser feito em seu favor.
*A pessoa que ama não se afasta do outro por causa dos seus fracassos.
*O amor capacita a pessoa que ama para uma doação cada vez mais plena e gratuita. Eis a razão pela qual a pessoa que ama de verdade é sempre a primeira a ser recordada nos momentos de sofrimento ou dificuldades.
*A pessoa que ama evita magoar, mas não deixa de dizer a verdade pelo simples facto de que o outro pode não gostar.

*A pessoa que ama é transparente no seu modo de se relacionar.
*Aceita o outro, apesar dos seus defeitos, pois sabe que a pessoa não se reduz aos defeitos que tem. Por isso o ser humano sente que seria mais pobre se não se tivesse cruzado com as pessoas que o amaram a ajudaram a realizar-se como pessoa. Tudo isto nos faz compreender como Jesus tinha razão ao resumir o Evangelho ao mandamento do amor.

Eis as suas palavras no evangelho de São João: “Dou-vos um mandamento novo: que vos ameis uns aos outros assim como eu vos amei. Por isto é que todos reconhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (Jo 13, 34-35).

Olhando para Jesus podemos compreender o que é amar:
*Amar é eleger o outro como alvo de bem-querer, aceitando como é e agir de modo a facilitar a sua realização e felicidade. Podemos desmontar e concretizar esta definição em atitudes e no jeito de nos relacionarmos com os irmãos.
*Amar implica estar presente nas horas difíceis, pois o amor tende sempre para a convergência da comunhão.
*Amar significa edificar de modo cooperante e não na concorrência desleal.
*Amar é ajudar o outro a gostar de si, valorizando as suas realizações e empenhamentos, mesmo quando não correspondem aos nossos interesses.

*Amar é ajudar o outro a superar a solidão e ajudá-lo a suportar os fardos com que a vida, por vezes, nos carrega.
*Amar é facilitar o amadurecimento do outro, dando-lhe oportunidades para que se realize com pessoa livre, consciente e responsável.
*Quem ama nunca substitui. Pelo contrário, ajuda sem se sobrepor.
*O amor ajuda a pessoa a compreender que é melhor do que receber.
*Amar é ajudar o outro a descobrir sentidos para viver de modo empenhado e feliz.
*Amar é ser capaz de ficar calado quando se está magoado, esperando a oportunidade certa para dialogar serenamente.

*Amar é acreditar no outro e não pretender que a minha opinião é a única válida.
*Amar é cultivar a arte de saber escolher como tema de conversa e passatempo assuntos agradáveis ao outro.
*Amar é também estar atento e saber calar-se quando percebe que a conversa está a cansar o outro.
*Amar reconhecer as qualidades do outro e não girar obsessivamente em volta dos seus defeitos.
*Amar é ser capaz de partilhar não só o que tenho, mas sobretudo o que sou.
*Amar é entender que a disponibilidade para escutar e acolher é mais importante do que os presentes.

*Amar é aceitar as diferenças, a fim de o outro ser tal como é e não pretender que ele seja uma cópia de mim mesmo.
*Ama mais e melhor quem dá o primeiro passo na linha da reconciliação. Foi assim que Deus agiu para connosco em Jesus Cristo.
*Amar é estar atento e verificar se o outro está precisando de mim. Não basta pensar: “quando quiser que venha ter comigo”.
*Ama mais quem se antecipa, a fim de ser dom para o outro. Amar é estar disposto a morrer a muitos planos e gostos para dar ao outro a possibilidade de sentir acolhido e amado.

*Jesus levou o amor até à sua expressão máxima: “Dar a vida pelo amigo”. O nosso amor será tanto mais perfeito quanto mais nos aproximarmos desta meta.
*O amor modela o nosso coração para a comunhão e capacita-nos para sabermos edificar a nossa casa sobre a rocha firme.
*Amar é a veste indispensável para participarmos no banquete do Reino de Deus.

No seu hino ao amor, São Paulo menciona algumas atitudes fundamentais para a pessoa que quer tomar o amor A sério. Eis algumas das suas afirmações: “Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se eu não tiver amor sou como um sino que soa ou um címbalo que retine. Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça toda a ciência e os mistérios. Ainda que eu tenha uma Fé tão grande que seja capaz de transportar montanhas, se não tiver amor nada sou. Ainda que eu distribua todos os meus bem e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, de nada me aproveita.

O amor é paciente e prestável. O amor não é invejoso. Não é arrogante nem orgulhoso. O amor não procura o seu próprio interesse e nada faz de inconveniente. O amor não guarda ressentimento. Não se alegra com a injustiça, mas rejubila com a verdade. O amor tudo desculpa. Acredita sempre. Tudo suporta e tudo espera. O Amor jamais passará” (1 Cor 1-8).

Na verdade, o amor é imortal, pois Deus é Amor (1 Jo 4, 7). O nosso jeito de amar é a nossa identidade espiritual, a qual é eterna. Como vemos, a vida eterna emerge no interior do tempo mediante a dinâmica das relações de amor. A nossa maturidade espiritual coincide com o nosso jeito de amar e nos relacionarmos com os outros.

A nível biológico, a nossa identidade são as nossas impressões digitais e o nosso ADN. A nível social é o nosso nome, naturalidade, data de nascimento e filiação. A nível espiritual, a nossa identidade é o jeito de nos relacionarmos e comungarmos com os outros. Na Comunhão Universal da Família de Deus dançaremos eternamente o ritmo do amor, mas com o jeito que tivermos treinado na História, pois somos seres em realização histórica. Por outras palavras, o nosso ser pessoal espiritual terá eternamente a configuração que foi adquirindo na História, através do jeito da nossa realização na História.


d) Maturidade e Atitudes Responsáveis

Crescer como pessoa responsável é uma tarefa que ninguém pode realizar por nós. Mas também é verdade que ninguém é capaz de se tornar verdadeiramente responsável sem se relacionar com as outras pessoas, pois somos seres que só podem realizar-se em relações. Eis alguns passos significativos para o nosso crescimento como pessoas responsáveis:

*Quando nos comprometemos a fazer uma coisa, executá-la.
*É fundamental que nos responsabilizemos pelos nossos actos sem cair na tentação das desculpas fáceis ou deitar as culpas para cima dos outros. Quando assumimos a responsabilidade das nossas atitudes e acções estamos a afirmar-nos e a estruturarmo-nos com este sentido: A pessoa, para se tornar verdadeiramente responsável deve treinar-se no sentido de tomar conta da sua vida e da sua realização pessoal.

*Devemos assumir com plena consciência o cumprimento dos nossos deveres, realizando as nossas tarefas.
*É importante não ficarmos à espera que sejam os outros a lembrar-nos a hora ou o cumprimento dos nossos deveres.
*Sejamos responsáveis pelos nossos compromissos, a fim de nos tornarmos dignos de confiança.
*Quando alguém depositar confiança em nós e nos comunicar um segredo, saibamos guardá-lo só para nós, a fim de não trairmos os nossos amigos. A pessoa que trai a confiança que alguém depositou nela não é digna da confiança de ninguém. Habituemo-nos a usar a cabeça antes de agir, a fim de actuarmos de actuarmos como pessoas responsáveis.

Quando nos habituamos a medir as consequências dos nossos actos estamos a estruturar uma personalidade verdadeiramente responsável. Uma pessoa que age habitualmente de modo irreflectido e precipitado nunca chegará a ser verdadeiramente uma pessoa responsável. Na medida em que as nossas decisões são previamente pensadas e amadurecidas, estamos a edificar-nos como uma pessoa responsável.

*Não deixemos de realizar os nossos projectos e sejam os fiéis aos nossos compromissos.
*Quando tivermos um trabalho para fazer, procuremos realizá-lo a tempo e horas, a fim de nos auto controlarmos e merecermos a confiança das outras pessoas. Podemos ter a certeza de que a nossa responsabilidade crescerá na medida em que formos fiéis aos nossos deveres e compromissos. Na verdade a responsabilidade é a capacidade que a pessoa tem de responder de modo fiel e adequado aos deveres, compromissos e talentos que possui.

Como acontece com todas as outras dimensões humanas, a nossa responsabilidade é algo que cresce através do exercício. A pessoa humana não nasce responsável, tal como não nasce consciente ou livre. Mas vamo-nos tornando responsáveis de modo gradual e progressivo. Deus não nos criou acabados, a fim de sermos responsáveis pela nossa realização e, deste modo, sermos autores de nós mesmos.

Ser responsável, portanto, é dar o melhor de si de acordo com os talentos que tem, tal como Jesus ensinou (cf. Mt 25, 14-30). Como capacidade de responder de modo de modo fiel e adequado aos seus talentos, projectos e compromissos, a responsabilidade cresce em conjunto com a consciência e a liberdade. Como ser consciente, a pessoa descobre o leque das suas possibilidades de realização, tanto de tipo pessoal como social. Como ser livre, a pessoa decide agir de modo fiel e adequado aos seus talentos e é capaz de assumir compromissos face às outras pessoas.

A liberdade é a capacidade de se relacionar amorosamente com os outros e de interagir de modo criativo com as coisas e os acontecimentos. Como capacidade associada à consciência e à liberdade, a responsabilidade não é uma capacidade estática, isto é, oposta a dinâmica da realização pessoal.


e) Esperança Cristã e Maturidade

A esperança é uma dimensão fundamental da vida da pessoa. A pessoa humana não nasce feita. O futuro de uma pessoa é aquilo que lhe falta para essa pessoa atingir a sua plenitude. Uma pessoa sem esperança é uma pessoa bloqueada na sua capacidade de sonhar a sua realização e a sua plenitude na comunhão universal do Reino de Deus. Mediante a esperança a pessoa antecipa um resultado positivo ou uma expectativa que se apresenta como promissora de um futuro bom. É pela porta da esperança que a pessoa entra positivamente na dimensão do futuro.

Iluminada pela Palavra de Deus, a esperança adquire horizontes novos e que muito para além daquilo que o Homem podia sonhar. A esperança cristã capacita a pessoa para saborear a vida, a história e o Universo com os critérios e os horizontes do próprio Deus. Quando a esperança é optimizada pela Palavra de Deus recebe o nome de esperança teologal ou esperança cristã. Neste caso, deixa de ser apenas a capacidade humana de a pessoa se projectar para o futuro indefinido.
Pelo contrário, a esperança cristã é um dom de Deus. É o resultado da acção do Espírito Santo que vai modelando o nosso coração com essa capacidade de se projectar num futuro bem definido, pois engloba a plenitude do projecto salvador de Deus.

Podemos dizer que a esperança cristã é a esperança humana optimizada pela acção do Espírito Santo que nos capacita para olharmos o nosso futuro dentro do projecto dos horizontes da revelação de Deus. Iluminado pelo Espírito Santo e a Palavra de Deus, o crente começa a saber ler os acontecimentos à luz do plano amoroso de Deus para a Criação. A esperança cristã, portanto, não é um desejo vago e informe do coração humano que deseja um futuro melhor. Pelo contrário, apoia-se no conhecimento do Deus que se revela nas Escrituras, e na certeza de que este Deus é fiel e verdadeiro.

Olhando o mistério de Deus à luz da História da Salvação e à luz da sua própria experiência de Deus, o crente compreende que o Deus da esperança não nos desilude, pois realiza sempre o que promete. Por outras palavras, o conteúdo da esperança cristã surge para os crentes como algo claro e definido com o qual eles procuram configurar os seus projectos de vida.

Como podemos ver, a esperança cristã, ultrapassa os muros estreitos da vida terrena abrindo-nos o horizonte da participação na Família de Deus como filhos em relação a Deus Pai e irmãos em relação a Deus Filho. Mas isto não quer dizer que ela nos afaste ou aliene dos compromissos terrenos. Pelo contrário, fortalece-os, pois a esperança dá aos crentes novos motivos para agir.

À medida em que a Fé vai amadurecendo, o crente sabe que Deus não nos criou acabados, a fim de sermos seus colaboradores na obra da nossa realização. Na verdade, a pessoa faz-se, fazendo. Cria-se, criando. A esperança assegura-nos que a nossa realização pessoal tem uma dimensão espiritual, a qual encontra a sua plenitude na comunhão da Vida Eterna. A Fé cristã é uma luz que ajuda o crente a compreender o plano de Deus. A esperança, por seu lado, lança o crente em direcção ao futuro, dando-lhe a garantia de que o projecto amoroso de Deus vai incorporar e dar plenitude à nossa realização na história.

A vida teologal ou cristã tem, além da Fé e da Esperança a vertente caridade, isto é, a capacidade de amar ao jeito de Deus. Falando deste tripé da vida teologal, São Paulo diz o seguinte: “Agora permanecem estas três coisas: a Fé, a esperança e a caridade. Mas a maior delas é a caridade” (1 Cor 13, 13).

O amor é a única que tem densidade eterna. Na verdade, a nossa identidade espiritual coincide com o nosso jeito de amar e comungar com os outros. A Esperança cristã confere aos crentes uma coragem e alegria renovadas. Além disso dá-nos coragem para correr riscos, fazendo-nos compreender que é através dos nossos compromissos históricos que vamos edificando aquilo que seremos eternamente na Família de Deus.

A Esperança cristã capacita-nos para sermos capazes de integrar numa história com sentido as dificuldades e sofrimentos que não conseguimos eliminar. Tenho a certeza, diz São Paulo, de que os sofrimentos do tempo presente nada são em comparação com a alegria e felicidade que o futuro nos aguarda em Deus (Rm 8, 18).

Movidos pela Esperança, os cristãos têm mais capacidade de viver em união com a vontade de Deus. A Carta aos Efésios diz que os cristãos de Éfeso, antes de se terem convertido ao Evangelho de Cristo, viviam sem esperança e sem Deus no mundo (Ef 2,12). Na verdade, os que não têm esperança não saboreiam os acontecimentos e a vida como fazendo parte de um projecto de amor e salvação.

Pela fé, os cristãos sabem que o Espírito Santo está no seu íntimo e podem contar com esta presença que facilita de modo admirável a nossa realização pessoal e o amor aos irmãos. Se acolhermos a presença do Espírito Santo no nosso íntimo a sua luz ajuda-nos a encontrar as saídas acertadas para edificarmos de acordo com o Deus da esperança.

A confiança neste Deus fiel e verdadeiro robustece a nossa esperança ajudando-nos a encontrar as respostas e as soluções certas para as dificuldades do dia a dia. A esperança cristã confere aos crentes a certeza que a sua vida tem sentido, pois leva no seu coração a certeza do sucesso. A esperança dá-nos a certeza de que Deus está empenhado com as nossas coisas, capacita-nos para nos sentirmos seguros e capazes de enfrentar as tarefas e dificuldades da vida.

Na medida em que nos faz ver a presença amorosa de Deus na nossa vida, a fé confere conteúdo à nossa esperança. Movido pela esperança, o cristão sente-se um filho muito amado de Deus. Eis o que diz a Carta aos Efésios: “E foi assim que Deus nos escolheu em Cristo antes da fundação do mundo, a fim de sermos santos e irrepreensíveis no amor, caminhando na sua presença. Predestinou-nos para sermos adoptados como seus filhos, por meio de Jesus Cristo, de acordo com o beneplácito da sua vontade” (Ef 1, 4-5).

São Paulo convida os cristãos de Roma viverem alegres na Esperança, pacientes nos sofrimentos e fiéis na oração (Rm 12, 12). Como vimos, o alimento da Esperança Cristã é a Palavra de Deus. É esta a razão pela qual São Paulo, referindo-se às Escrituras diz: “Tudo o que foi escrito no passado, foi escrito para alimentar a nossa esperança” (Rm 15, 4).

A vida cristã é um jeito teologal de viver. É isto que nos distingue dos outros seres humanos. Quanto mais crescemos na vida teologal, mais Cristo se torna o centro da nossa vida. São Paulo diz que o cristão adulto na fé tudo é referido a Cristo, quer se trate de viver quer de morrer. “Para mim, viver é Cristo e morrer é um lucro” (Flp 1, 21).

A Esperança dá-nos a certeza de que não estamos abandonados por Deus, diz o profeta Jeremias: “Conheço muito bem os projectos que fiz para vós, diz o Senhor. Eu fiz planos para prosperardes e não para serdes aniquilados. Os meus planos são o fundamento da esperança num futuro bom. Então chamareis por mim. Far-me-eis a vossa oração e eu escutar-vos-ei” (Jer 29, 11-12).

A esperança cristã confere aos crentes a certeza de que a Palavra de Deus acontecerá, pois a sua fidelidade é inabalável. Mesmo nos momentos de dificuldades, a esperança dá-nos a certeza de que não estamos sós, pois Deus é fiel. Em resposta a um pedido de ajuda de São Paulo, Deus respondeu: “Basta-te a minha graça, pois o meu poder libertador é perfeito quando se trata de ajudar a fraqueza” (2 Cor 12, 9).

Segundo o Evangelho de São João, Jesus robustece a esperança dos Apóstolos, garantindo-lhes que apesar da sua morte estes nunca serão esquecidos: “Agora estais abatidos, mas ver-vos-ei de novo e haveis de vos alegrar e já ninguém poderá tirar-vos a vossa alegria” (Jo 16, 22). A Carta aos Colossenses indica uma norma sábia para o amadurecimento da esperança: “Colocai a vossa mente nas coisas do alto e não nas terrenas” (Col 3, 2). Quanto mais a nossa mente e o nosso coração se deixam possuir pela Palavra de Deus, mais se robustece a nossa fé e mais sólida fica a nossa esperança.

O Salmo 126 diz que aos crentes semeiam na esperança colherão com alegria, pois Deus não falha: “Os que semeiam com lágrimas vão ceifar com cânticos de alegria. Os que saem chorando, ao levar a semente para a sementeira, voltarão com canções de alegria trazendo os molhos de espigas consigo” (Sal 126, 5-6).

A Palavra de Deus vai germinando no coração dos que a acolhem uma esperança com pleno sabor a plenitude. Isto faz dos crentes arautos da esperança libertadora de Cristo, como diz a Primeira Carta de São Pedro: “Acolhei Cristo nos vossos corações, a fim de estardes preparados para responder aos que vos procuram sobre as razões da vossa Esperança” (1Pd 3, 15).

Os horizontes da nossa esperança assentam sobre os dados da fé e não na evidência. A Esperança assegura-nos de que havemos de nos encontrar face a face com o nosso Deus. Nessa altura conhecê-lo-emos directamente, tal como somos conhecidos por ele (1 Jo 3, 2). A esperança dá-nos a garantia de que apesar dos sofrimentos da vida presente, Deus tem para nós uma plenitude onde a nossa alegria não terá limites nem condicionamentos. O único limite será a nossa capacidade de saborear a alegria e felicidade infinita de Deus: “Bem aventurados os que agora chorais, pois haveis de rir” (Lc 6, 21).

Fomos criados para a felicidade. A nossa esperança dá-nos a certeza de que este plano amoroso de Deus se realizará. A nossa fé diz-nos que a Palavra de Deus e o Espírito Santo actuam em perfeita harmonia. A Palavra para nos revelar o sentido do plano salvador de Deus. O Espírito Santo para tornar a Palavra fecunda, isto é, realizando em nós o que a Palavra significa, pois a Palavra de Deus é eficaz graças à acção do Espírito Santo.

A Carta aos Hebreus diz que Abraão é um modelo de Esperança. Apesar de a evidência sugerir o contrário, Abraão confiou em Deus, abrindo o seu coração à esperança. Graças a esta esperança, Abraão confiou no Senhor. E foi assim que ele obteve aquilo que esperava. É sinal de maturidade tomar a sério a Palavra de Deus e agir em conformidade com ela. O Cristão amadurecido na fé sabe que Deus nunca desilude. Eis as palavras da Carta aos Hebreus: “E assim, depois de ter esperado com paciência, Abraão recebeu o conteúdo da promessa” (Heb 6, 15).

A Esperança cristã é cristocêntrica. O conteúdo da promessa, isto é, o horizonte da nossa salvação, é a participação na Festa da Família de Deus com Cristo ressuscitado. Nessa festa dançaremos o ritmo do amor com o jeito com que tivermos treinado agora no processo da nossa realização histórica. A Esperança cristã, portanto, capacita-nos para vermos a nossa meta com o olhar do próprio Deus.

Isto quer dizer que as lentes da esperança optimizam e ampliam a luz da nossa inteligência. A esperança alcança a nossa plenitude com Deus, a qual não se reduz aos bens do corpo, pois atinge aponta para a plenitude da comunhão universal do Reino de Deus. Por outras palavras, a esperança cristã ultrapassa os muros estreitos da vida que morre, abrindo-nos os olhos do coração para contemplarmos, não apenas os bens da Terra, mas também os bens do Céu.

Mas isto não quer dizer que a esperança cristã distrai os crentes dos compromissos históricos. Pelo contrário, a Palavra de Deus envia-nos para o mundo com critérios diferentes dos do mundo. Os cristãos, diz o evangelho de São Mateus, são sal, luz e fermento no meio do mundo (cf. Mt 5, 13-16). A esperança garante-nos de que havemos de viver para sempre como membros da Família Deus, isto é, filhos em relação a Deus Pai e irmãos em relação a Deus Filho. Isto quer dizer que à luz da esperança cristã, os sofrimentos e a própria morte não são entendidos como tragédias sem sentido (Rm 8, 18).

Depois de uma vida gasta ao serviço do bem e do amor aos irmãos, o cristão, amadurecido e alimentado por uma vida por uma esperança robusta, compreende perfeitamente estas palavras de São Paulo: “Por isso não desfalecemos. E mesmo se em nós o homem exterior vai caminhando para a ruína, o homem interior renova-se todos os dias. Com efeito, a nossa momentânea e leve tribulação proporciona-nos um peso eterno de glória além de toda e qualquer medida. Não olhamos para as coisas visíveis, pois estas são passageiras. Pelo contrário, olhamos para as realidades invisíveis que são as eternas” (2 Cor 4, 16-18). Fundada no acontecimento da ressurreição de Jesus Cristo, a esperança cristã dá-nos a certeza de que não estamos a caminhar para o fracasso final de uma morte sem saída, mas para a plenitude da Vida Eterna.


f) Comunidade e Maturidade de Fé

A comunidade é uma realidade orgânica e dinâmica. Eis a razão pela qual São Paulo lhe chama o Corpo de Cristo (1 Cor 10, 17; 12, 27). O evangelho de São João diz que os membros da comunidade são os ramos da videira cuja cepa é Jesus Cristo. O sangue que alimenta e fortalece este Corpo de Cristo é, naturalmente, o Espírito Santo. Ele é a seiva que vitaliza e fortalece os circuitos vitais entre a cepa e os ramos da videira. O Espírito Santo é a Água Viva que faz jorrar no nosso íntimo rios de Vida Eterna (Jo 7, 37-39; 4, 14).

Nós fomos baptizados num mesmo Espírito, diz São Paulo, a fim de formarmos um só Corpo: “Pois, como o Corpo é um só e tem muitos membros e estes membros, apesar de serem muitos, constituem um só Corpo, assim também Cristo. De facto, todos nós fomos baptizados num só Espírito, a fim de formarmos um só corpo, pois tanto os judeus como os gregos, os escravos ou cidadãos livres todos bebemos de um só Espírito, a fim de formarmos um só corpo” (1 Cor 12, 12-13).

Isto que dizer que quando trabalhamos para edificar a comunidade, estamos a edificar o Corpo de Cristo. Os membros da comunidade são todos inspirados pela Palavra de Deus e pela acção do Espírito Santo. Quanto mais os crentes crescem na Fé, mais aptos estão para realizar uma acção evangelizadora eficaz. Por serem membros do Corpo de Cristo, os crentes têm todos a mesma dignidade fundamental, pois todos são filhos de Deus.

A diversidade de funções e ministérios não altera esta igualdade fundamental dos crentes. Todos são chamados a exercer funções e ministérios na comunidade. Não há verdadeira comunidade se não houver um projecto comum com metas e objectivos. Para serem membros válidos na edificação da comunidade, os crentes devem procurar desenvolver algumas qualidades importantes.

Eis algumas qualidades importantes para a edificação da comunidade:
*Generosidade
*Entrega
*Entusiasmo
*Espírito de cooperação
*capacidade de diálogo
*Disponibilidade para escutar
*Caridade
*Sentido de Responsabilidade
*Iniciativa
*Docilidade à acção do Espírito Santo.

Não há comunidade autêntica sem uma amizade leal e verdadeira entre as pessoas que a constituem. A comunidade não deve ser muito grande, a fim de todos poderem intervir nos momentos de decisão programação e distribuição de tarefas. O que é decidido e programado em comunidade deve ser respeitado. Quando as decisões e a programação já não funcionam bem, é altura de se fazer uma revisão e, se necessário, elaborar uma nova programação.

Não nos podemos esquecer de que a comunidade é um organismo vivo e, portanto, em processo de crescimento. Pretender amarrar a comunidade a decisões e programações estáticas e imutáveis significa bloquear a dinâmica do Espírito Santo. São Paulo afirma que é o Espírito Santo que torna os membros aptos para a acção evangelizadora: “Não é que sejamos capazes de algo por nós mesmos. É de Deus que nos vem a capacidade. Na verdade, é ele que nos torna aptos para sermos ministros de uma Nova aliança, não da letra, mas do Espírito Santo. De facto, a letra mata, mas o Espírito vivifica” (2 Cor 3, 5-6).

Para nos tornarmos mais conscientes da importância do nosso agir na edificação da comunidade podemos colocar-nos algumas questões fundamentais:
1-Dou-me conta de que eu, como os demais seres humanos, tenho tendência a auto enganar-me e a iludir-me?
2- Procuro tornar-me consciente das motivações mais profundas do meu agir? Tenho de tomar consciência de muitas vezes as motivações dos meus comportamentos e atitudes resultam de motivações inconsciente que não são as motivações que eu pretendo apresentar para mim ou para os outros?

3- Dou-me conta de que muitas das minhas desculpas e demissões são fruto da minha preguiça e falta de amor à causa da evangelização?
4- Apercebo-me de que a minha falta de flexibilidade e esforço para entender as razões do outro dificulta a vida dos meus irmãos e limita as minhas possibilidades de realização pessoal?
5- Dou-me conta de que muitas vezes não estou a fazer de Deus a questão primeira da minha vida?
6- Não será que a minha falta de generosidade e espírito de sacrifício me levam a desanimar com grande facilidade, acabando por me demitir face às mais pequenas adversidades? Estou atento para vencer a tentação de pensar que já sei tudo?

7- Não serei eu daqueles que estão sempre dispostos a mudar a vida dos outros, mas nada fazem para mudar a própria vida?
8- Quais foram os momentos mais importantes da minha caminhada de Fé?
9- Dou-me conta de que os momentos em que fui mais feliz foram aqueles em que fui generoso?
10- Tomo a Fé e o Evangelho a sério, ao ponto de estar disposto a correr riscos como Jesus e os profetas correram?
11- Como reajo face às mudanças e às interpelações do novo na comunidade?
12- Que valores me motivam mais nesta fase da minha vida e no desejo de me realizar como apóstolo?

13 Recordo com gratidão alguns crentes que tenham sido mediações especiais do amor de Deus para mim?
14- Sinto que outras pessoas, da comunidade ou não, me vão recordar com gratidão porque ficaram mais felizes por se terem cruzado comigo na vida?
15- Quais os talentos que posso aportar á comunidade?
16- Sinto-me comprometido com os outros e tenho consciência de que, para me realizar como crente tenho de ser corresponsável na vida da comunidade? Não podemos esquecer-nos de que a comunidade forma uma união orgânica. Nenhum membro pode demitir-se ou alhear-se sob pena de bloquear ou entravar o crescimento da mesma sob pena de não crescer e impedir o crescimento dos outros.

1 comentário:

  1. O Padre Santos imprimiu de tal forma a Sua Maturidade e jeito de Amar, que ao ler toda esta informação tenho a impressão de o ter a meu lado. É como se ouvisse Sua voz ao vivo.Marcou-me de tal forma interiormente, que mentalmente visualizo seu jeito peculiar e atraente de falar de Deus. A rúbrica "Caminhos de Maturidade Humana e Cristã"; é a sua Autobiografia Espiritual. Viveu o que escreveu e agora dança os ritmos do Amor na Comunhão Espiritual, onde espero ter a Veste para o Banquete e ser achado digno da Festa...Tenho saudades de Ti.

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