A Catequese, a Fé e o Sentido da Vida




a)A Menina Que Descobriu o Mistério de Deus
1-A Descoberta da Ana Patrícia
2-O Diálogo da Santíssima Trindade
3-A Missão das Pessoas Divinas
4-Os Pais Humanos São Um Dom de Deus

b)Um Modo Desumano de Fazer Catequese

c)Quando a Fé dá Sabor à Vida

d)Descobrir a Humanidade e a Divindade de Cristo
1-A Divindade do Filho Eterno do Pai
2-A Fidelidade de Cristo à Vontade do Pai
3-Humanidade de Jesus e Salvação
4-Cristo é Homem Connosco e Deus com o Pai

e)Quando a Vida Fica Sem Sentido



a) A Menina Que Descobriu o Mistério de Deus

1- A Descoberta da Ana Patrícia

A Ana Patrícia tinha sete anos quando fez uma descoberta muito bonita na catequese. Naquele dia, a Ana Patrícia estava desejosa de chegar a casa para contar à mãe a descoberta que tinha feito. A mãe apercebeu-se de que ela tinha algo de importante para lhe comunicar e por isso, antecipando-se, perguntou-lhe: “Sinto que tens algo de importante e muito bonito para me dizer. Queres contar-me agora?”.

Satisfeita por ver a mãe disponível para a escutar, a Ana Patrícia começou, então, a descrever a sua descoberta: Eu já sabia que todas as crianças têm um pai e uma mãe. Eu também sabia que os pais da Rita são uns e os pais do Miguel são outros. Também sabia que as pessoas que têm os mesmos pais são irmãos. Também já sabia, acrescentou a Ana Patrícia, que os nossos pais e os nossos avós tiveram os seus pais. Eu já tinha aprendido que Adão e Eva foram os primeiros pais humanos.

Mas hoje descobri uma coisa nova muito importante: há um Pai que é pai de todos os pais, de todos os avós e bisavós e que foi o pai de Adão e Eva. Hoje descobri que Deus é uma família de três pessoas e que nós pertencemos todos à mesma Família de Deus. Isto quer dizer que a mãe e o pai também são filhos de Deus e que, no céu, nós seremos todos irmãos.

2- O Diálogo da Santíssima Trindade

A mãe da Ana Patrícia aproveitou a oportunidade para lhe explicar este mistério de sermos todos membros da Família de Deus e disse-lhe: “Acabaste de fazer uma descoberta muito importante. De facto, Deus é uma família de três pessoas cujos nomes são: Pai, Filho e Espírito Santo.

Uma vez, continuou a mãe da Ana Patrícia, as pessoas divinas combinaram um plano muito bonito para todos nós. Foi assim: Deus Pai, falando com o seu Filho e o Espírito Santo disse-lhes: “Vamos criar os seres humanos à nossa imagem e semelhança e vamos fazer deles membros da nossa família. Eu vou ser um Pai para todos eles.”

Depois, o Filho de Deus acrescentou: “Uma vez que tu és meu Pai, então eles vão ser meus irmãos”. Depois, Deus Pai confirmou e disse: “fazes-te um deles pela Encarnação e assim tornas-te o primogénito, isto é, o primeiro de muitos irmãos (cf. Rm 8, 29). Depois Deus Pai acrescentou: “Eu acho que o Espírito Santo também tem algo de importante para dizer.

O Espírito Santo é a ternura maternal de Deus. Na verdade, o seu jeito de amar é como o de uma mãe infinitamente boa. Como sabemos os meninos e as meninas entram nas famílias humanas, através das mães. Por outras palavras, é pela ternura maternal que os filhos entram nas famílias humanas, diz o Espírito Santo. Como eu sou a ternura maternal de Deus, deve ser por mim, diz o Espírito Santo, que os seres humanos devem ser introduzidos na Família de Deus. Na verdade, São Paulo diz que os seres humanos que se deixam conduzir pelo Espírito Santo são filhos de Deus Pai e irmãos do Filho de Deu (Rm 8, 14.17).


3- A Missão das Pessoas Divinas

Em seguida, Deus Pai disse ao Espírito Santo: Tu passas a ser o amor de Deus derramado no coração dos seres humanos (cf. Rm 5,5). E o Filho de Deus acrescentou: “Se eu entro na família humana pela encarnação, então a encarnação vai acontecer pelo Espírito Santo, pois ele é a ternura maternal de Deus”. “Depois de encarnar, já posso comunicar aos seres humanos a força do Espírito Santo, dando-lhes assim o poder de se tornarem filhos de Deus.

O poder de nos tornarmos filhos de Deus, diz o evangelho de São João, é-nos dado por Cristo ao encarnar. Este poder não nos é dado pela vontade do Homem, nem por decisão da carne, mas sim pela vontade do Pai do Céu que nos envia o seu Filho e o Espírito Santo” (cf. Jo 1, 12-14).

Depois o Espírito Santo aproveitou para dar algumas sugestões. O Espírito Santo tem um jeito especial para dar sugestões bonitas e boas para a Humanidade. Tomando a Palavra, disse: “O Filho de Deus, ao encarnar, abre as portas da família de Deus a os seres humanos. Para completarmos esta obra de amor e salvação, tu que passas a ser o Pai de todos, podias derramar o teu amor de pai bondoso no coração dos pais humanos, a fim de estes amarem muito os seus filhos”.

Deus Pai gostou muito das palavras do Espírito Santo e disse: “Muito bem: Eu vou meter no coração dos pais o meu jeito de amar, a fim de os seus filhos, que também já são meus filhos, sejam pessoas muito felizes”. Depois o Espírito Santo acrescentou: “E como eu amo com ternura maternal, vou introduzir o meu jeito maternal de amar na coração das mães, a fim de os filhos dos seres humanos serem pessoas bem-amadas. Vou começar por fazer isto no coração de Maria, a mãe do Filho de Deus, a fim de ela amar o seu Filho com o próprio jeito de amar do Espírito Santo”.


4- Os Pais Humanos São Um Dom de Deus

E Maria, a mãe de Jesus, amou de facto o seu Filho com a ternura especial do Espírito Santo. Foi por esta razão que Maria ficou cheia do Espírito Santo no momento em que o anjo lhe anunciou que ela ia ser a mãe do Filho de Deus.

Eis as palavras que o anjo disse a Maria nesse momento em que lhe anunciou o grande dom que Deus lhe ia conceder: “O anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré. O anjo tinha a missão de comunicar uma mensagem a uma jovem desposada com um homem da casa de David cujo nome era José. Ao entrar na casa de Maria, o anjo disse-lhe: “Avé Maria, cheia de graça. O Senhor Deus está contigo” Ao ouvir aquela voz, Maria ficou perturbada, pois não entendia o sentido daquelas palavras.

Então o anjo disse-lhe: “Não tenhas medo, Maria, pois Deus vai favorecer-te. Vais conceber um filho no teu seio um filho ao qual porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-se-á filho do Altíssimo (…). Depois o anjo acrescentou: “O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo estenderá o seu poder sobre ti. Por isso é que o Menino que vai nascer de ti, acrescentou o anjo, será chamado Filho de Deus” (Lc 1, 26-35).

Graças à explicação da sua mãe, a Ana Patrícia compreendeu que Deus nos ama a todos como membros da sua Família: Deus Pai é pai de todos nós. Graças a isso somos todos irmãos uns dos outros e Jesus Cristo, como é o Filho de Deus, é também nosso irmão. No nosso coração habita a ternura do Espírito Santo que nos conduz ao Pai. Nesse momento, Deus Pai acolhe-nos como filhos e dá-nos um beijo.

Os pais que amam muito os seus filhos são um dom muito especial de Deus pai para os seus filhos. Nesse dia, a Ana Patrícia aprendeu que é o Espírito Santo que no nosso coração nos ensina a dizer “Abba” isto é, Papá. Compreendeu também que é Deus Pai que prepara o coração dos nossos pais, a fim de eles nos amarem com o próprio jeito de Deus.

b) Um Modo Desumano de fazer Catequese

Aquela mulher parecia uma estátua de granito. Jamais revelou os seus sentimentos. Na catequese transmitiram-lhe a noção de um deus castrador e inimigo da felicidade humana. Em si mesmo, Deus era um ser triste, pois sofria constantemente por causa dos pecados humanos. Como associava a sexualidade a pecado, esta mulher nunca casou. As pessoas que viviam com ela nunca sabiam se ela sofria ou estava feliz.

Como sofria por causa dos pecados humanos, Deus enviou o seu Filho ao mundo, a fim de ser desagravado por ele. O sofrimento do Filho de Deus foi decidido por Deus seu Pai, a fim poder perdoar os pecados dos seres humanos. Deus é um ser sempre faminto de sofrimentos, pois só o sofrimento dos seres humanos pode aplicar a justiça punitiva de Deus.

Na medida que haja seres humanos a sofrer, Deus vai concedendo alguns dons aos homens. Por outras palavras, Deus oferece dons aos seres humanos em troca de sofrimentos. Por isso Deus escolhe seres humanos a quem confere a missa especial de sofrerem muito, a fim de aplacarem a justiça de Deus. As doenças, dizia ela, são mimos de Deus. A pessoa que mais sofre mais amada é de Deus.

Estava constantemente a tentar incutir sentimentos de culpa nas pessoas que a rodeavam. Quando podia traumatizava crianças com imagens terríficas do Inferno com fogo a arder e diabos, de forquilha na mão, a empurrar as almas bem para o centro do fogo. Os prazeres mais legítimos e inocentes eram para ela obras do pecado e a principal causa da ira de Deus. O seu rosto de pedra fria nunca permitiu tirar conclusões sobre os seus estados de espírito. Esforçava-se constantemente por incutir nas pessoas sentimentos de culpa e medo do deus perverso que a sua catequista conseguiu gravar na sua mente.

Na verdade, a imagem que uma pessoa tem de Deus depende daqueles que lhes comunicaram os dados da fé. Isto permite-nos concluir que as pessoas que educaram e comunicaram a fé a esta mulher acabaram por roubar-lhe o direito de se humanizar e ser feliz. É por esta razão que aquela mulher nunca ri espontaneamente. As risadas não agradam a Deus, repetia ela sempre que via as pessoas sorrir e seres felizes.

Certa noite em que não conseguiu dormir devido a cólicas que a atormentaram esta mulher não se levantou como de costume para ir à missa. Nesse dia, a meio da manhã, escorregou e provocou uma rotura muscular. Tirou imediatamente a ilação: isto foi castigo de Deus pois esta manhã não fui à missa.

O deus que esta mulher tinha gravado na sua mente é uma falsa divindade, um tirano e um castrador que nada tem a ver com o Deus de Jesus Cristo. O rosto e a história desta mulher são realidades tristes e sem encanto. Na verdade trata-se de uma mulher mutilada que ficou incapaz de comunicar ternura, mesmo que se trate de uma criança.

Para ela, as crianças são um terreno privilegiado para semear o medo de Deus e do fogo terrível do inferno. É incapaz elogiar uma pessoa. Esse procedimento é ir contra a vontade de Deus que quer que as pessoas sofram. Como tem tido muitos problemas de saúde, diz frequentemente que Deus a escolheu como predilecta, pois é graças aos sofrimentos dos seus predilectos que Deus vai perdoando aos pecadores.

Podemos dizer que o deus daquela mulher é a projecção do que de pior existe no coração e na mente dos seres humanos. O coração desta mulher ficou mirrado por falta de ternura. A sua história triste e fria é o retrato do Deus que lhe incutiram na catequese distorcida que recebeu. Ela costumava dizer que a sua catequista lhe ensinara a fazer muitas penitências, a fim de suavizarmos os sofrimentos de Deus. As pessoas que não se martirizam, dizia-lhe a catequista, vão para o inferno, pois não aliviam os sofrimentos de Deus. Quando o ser humano deforma o rosto de Deus, a realidade do Homem é também distorcida.

Todas as manhãs, à mesma hora de sempre, as pessoas viam passar esta mulher sem sentimentos para a missa. Depois, ao terminar a missa, lá ia ela para o mercado. O seu aspecto era o de uma mulher que não teve o privilégio de saborear as alegrias da vida. As energias que podiam ter tornado a sua vida gostosa mediante gestos de ternura e comunhão amorosa, foram gastas em asceses estéreis e doentias.

É dramático verificarmos como se pode distorcer a verdade da vida em nome de uma falsa divindade. Esta mulher foi mais vítima que culpada. Outros a castraram, impedindo-a de dar frutos de ternura e comunhão. Depois de muitos anos de vida dura, morreu tal como viveu: sem exprimir o mais pequeno sentimento ou emoção. O deus perverso em que aquela mulher acreditava não fez bem a ninguém. Nem mesmo a ela própria. Ninguém lhe agradeceu os sacrifícios que fez, pois não conduziram ao amor nem à fraternidade.


c) Quando a Fé dá Sabor à Vida

Certo dia o Pedro perguntou à Joana: “Qual é o segredo para estares todos os dias tão serena, alegre e feliz? Nota-se que levas no teu íntimo uma força capaz de transportar o mundo sobre os teus ombros. Por vezes começo a olhar para ti e tenho a sensação que levas no coração um manancial inesgotável de energias! Exultas com as coisas boas que te acontecem e nunca te deixas abater pelas contrariedades e problemas. Depois o Pedro continuou: Nunca te vi abatida. O sorriso irradia, não apenas dos teus lábios, mas também dos teus olhos e do teu íntimo!”

Com os olhos a brilhar de contentamento devido às palavras do Pedro, a Joana respondeu: “Sinto dentro de mim a força da fé que está a crescer dentro de mim e que é a fonte dessa alegria de que falas! Esta fé é, na verdade, a fonte da alegria e da paz de coração!” O Pedro perguntou: Mas em quem é que acreditas para estares habitada por essa força que te dá segurança e paz?

A Joana respondeu: No princípio, quando ainda não havia estrelas e o Universo não existia. Mesmo antes que a luz tivesse sido criada, já existia a vida plena e o amor infinitamente perfeito. Antes de ter acontecido a explosão primordial que deu origem à génese do Universo, já existia uma Família constituída por três pessoas infinitamente perfeitas.

Esta comunhão familiar, continuou a Joana, é a fonte de todas as energias que existem no Universo, incluindo as energias espirituais que geram em nós a paz do coração, a alegria e a capacidade de amar. Jesus revelou-nos o rosto comunitário de Deus, ensinando-nos a chamar Pai à primeira pessoa, Filho à segunda pessoa e Espírito Santo à terceira. Podemos chamar Deus a esta comunhão familiar ou, então, Santíssima Trindade.

O mais maravilhoso de tudo isto, disse ainda a Joana, é sabermos que Deus habita no nosso coração, tornando-se em nós um manancial de Água Viva a jorrar Vida Eterna, dizia Jesus. A nascente da Água Vivia que faz jorrar a Vida Eterna, diz o evangelho de São João, é o Espírito Santo.

Podes comunicar permanentemente com ele no teu íntimo, pois nunca está longe de ti. Como o Espírito Santo é uma pessoa, podes falar com ele como um amigo fala com outro amigo. Além disso, nunca tenhas medo de o incomodar, pois ele está sempre disponível. Podes comunicar com ele a qualquer hora e em qualquer lugar: Quando viajas, ele acompanha-te. Quando sobes ao alto da montanha lá está contigo. E se mergulhares nas profundidades do Oceano, lá se encontra também, pois nunca está longe.

Quando descobri esta disponibilidade incondicional do Espírito Santo, continuou a Joana, abri-lhe o coração e a felicidade invadiu-me. Certo dia em que estava a falar com ele, senti que ele me segredava muito baixinho e com uma ternura infinita: “Divulga-me. Fala de mim aos teus amigos, a fim de eles poderem experimentar a paz de coração e serem felizes como tu! Se fizeres isto estás a ensinar aos teus companheiros e amigos o caminho seguro para a felicidade”.

Abre o teu coração a esta fonte de Água Viva, disse a Joana entusiasmada, e vais ver o que significa ser feliz! Mas toma atenção porque vais sentir um desejo enorme de falar desta maravilha a toda a gente! Quando ouvires a voz meiga do Espírito Santo compreenderás, como eu compreendi, o segredo desta alegria que me habita.

Depois a Joana concluiu dizendo algo de muito importante e verdadeiro: “Sabes, Pedro, afinal a felicidade não é uma questão de ter muitas coisas. Na verdade, o importante é ser feliz, não amontoar muitas riquezas. Uma vez li um ensinamento de São Paulo na Carta aos Gálatas, que diz o seguinte: Os frutos do Espírito Santo são: o amor, a alegria e a paz (Ga 5, 22).

Como é o amor maternal de Deus, o Espírito Santo ama-nos com uma ternura maternal infinita e capacita-nos para amar, pois ninguém é capaz de amar antes de ter sido amado. Quando nos dispomos a acolher o Espírito Santo, dando-lhe atenção, tudo começa a ser diferente e muito mais bonito!

Outro fruto desta acção do Espírito Santo em nós é que começamos a ser capazes de amar aqueles que se cruzam connosco na vida. A minha felicidade depende mais do Espírito Santo do que de mim, acrescentou a Joana. Mas não nos podemos esquecer de que a felicidade, além de dom, é também uma tarefa, pois Deus não nos substitui.

Encontrar Deus é encontrar a possibilidade máxima da nossa realização e felicidade, pois a sua vontade a nosso respeito, coincide com o que é realmente melhor para nós. Se comunicamos com o Espírito Santo no nosso íntimo, podemos ter a certeza de que ao sentirmos qualquer dificuldade, se dialogarmos com ele, a solução começa a nascer na nossa mente e no nosso coração. É verdade que Deus não nos substitui, mas ilumina e sugere caminhos adequados para vencermos os obstáculos que nos dificultam a vida.

Esta experiência da presença de Deus em nós ensinou-me que a felicidade é um edifício que assenta sobre os pilares da fé, da esperança e do amor a Deus e aos irmãos. Esta experiência ensinou-me que Deus é fiel, acrescentou a Joana, pois nunca desilude aqueles que confiam nele. Pedro, partilhei contigo a experiência mais bonita que me aconteceu, a qual está também ao teu alcance. O mundo pensa que a felicidade habita fora das pessoas. Muitos pensam que ela se encontra no poder, nas riquezas ou no domínio dos outros. O Evangelho de Jesus diz que os critérios do mundo estão errados. Recorda-te sempre desta verdade, disse a Joana: Não devemos permitir que a nossa felicidade dependa dos outros. É verdade que não podemos ser felizes sem os outros. Mas nunca nos devemos esquecer que a felicidade está mais em dar do que em receber. Nós não podemos ser felizes sem os demais, mas eles não são a fonte da nossa felicidade.

Jesus tinha razão quando ensinou aos discípulos que só Deus pode encher plenamente o nosso coração. A história da Joana é um convite a olhar a vida com os critérios da fé cristã. As pessoas que tomam Deus a sério nunca ficam desiludidas nem se sentem enganadas.


d) Descobrir a Humanidade e a Divindade de Cristo

1- A Divindade do Filho Eterno do Pai

São João inicia o seu evangelho, proclamando Jesus Cristo como o Filho eterno de Deus: “No princípio era o Verbo e o Verbo era Deus. No princípio, o Verbo estava com Deus e era Deus (Jo 1, 1-2). Deste modo, São João pretende, não apenas dizer que Jesus Cristo é o Filho de Deus, como fizeram os outros evangelhos, mas dizer igualmente que ele é Deus desde toda a eternidade. Se isto é assim, então Deus não é um sujeito eterno e infinito, mas sim uma comunhão familiar.

Por isso ele apresenta a união do Pai com o Filho em forma de uma comunhão orgânica: O Pai e o Filho fazem um (Jo 10, 30). Apesar de formar uma comunhão orgânica e dinâmica, o Pai e o Filho não se confundem. Nesta união do Pai com o Filho, o Espírito Santo tem um papel activo. Ele é princípio animador das relações e vínculo de comunhão: “Mas o Paráclito, o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome esse é que vos ensinará e recordará tudo o que eu vos disse” (Jo 14, 26).

De tal modo o Pai e o Filho estão em perfeita harmonia que São João disse que ao olharmos o modo de Jesus agir é compreender o rosto de Deus Pai: “Há tanto tempo que estou convosco e ainda não me conheces Filipe? Quem me vê, vê o Pai. Como é que ainda me dizes: Mostra-nos o Pai?” (Jo 14, 9).

Há filhos humanos que, a nível genético, são quase uma cópia do pai ou da mãe. O modo de Jesus actuar como Filho de Deus, é uma cópia perfeita do amor e do plano que Deus Pai tem para nós. Segundo o evangelho de São João, Jesus tinha perfeita consciência disto e por isso disse que ele e o Pai fazem um (Jo 10, 30).


2- A Fidelidade de Cristo à Vontade do Pai

A Vontade de Jesus Cristo e a vontade de Deus Pai estavam em total sintonia. Eis algumas expressões de Jesus que exprimem bem esta união de vontades: “O meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (Jo 4, 34). “Eu não procuro a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou” (Jo 5, 3). E ainda: “Eu desci do Céu, não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. E a vontade daquele que me enviou é esta: que eu não perca nenhum dos que ele me deu, mas os ressuscite no último dia. A vontade de meu Pai é que aqueles que vêem o Filho e acreditam nele tenham a vida eterna” (Jo 6, 38-40).

O Filho de Deus existe desde toda a eternidade. Veio ao mundo para realizar a divinização da Humanidade, dando-nos o poder de nos tornarmos filhos de Deus (Jo 1, 12-14). Por seu lado, o Pai entrega a obra da salvação nas mãos do Filho, pois o querer do Pai e o querer do Filho estão em plena concordância: “O Pai não julga ninguém, mas entregou ao Filho o poder de julgar, a fim de os homens honrarem o Filho como honram o Pai. Aquele que não honra o Filho também não honra o Pai, pois o filho foi enviado pelo Pai” (Jo. 5, 22- 23). Com efeito, acrescenta Jesus, o pai ama o filho e colocou todas as coisas nas suas mãos” (Jo 3, 35).

A fé no Filho, portanto, é uma componente fundamental da própria fé no Pai: “Aquele que acredita em mim, não só acredita em mim, mas também naquele que me enviou” (Jo 12, 44). “E aquele que me enviou está comigo e em mim. Com efeito, o Pai não me deixou sozinho, pois eu faço constantemente as coisas que lhe agradam” (Jo 8, 29).

Eis a razão pela qual o Senhor Ressuscitado se considera irmão dos homens: “Eu subo para junto do meu Pai e vosso Pai; para o meu Deus e vosso Deus” (Jo 20, 17). Este texto é muito significativo, pois demonstra que João, apesar de insistir constantemente que Jesus Cristo é Deus com o Pai, não ignora que ele é também homem connosco.

3- Humanidade de Jesus e Salvação

E é pelo facto de ele ser homem connosco que nós estamos salvos. De facto, nós somos incorporados na família de Deus, não como seres isolados, mas na medida em que formamos uma união com Cristo. Estamos em dinâmica de salvação na medida em que estamos organicamente unidos a Jesus Cristo.

Trata-se de uma união semelhante à união que existe entre os ramos e a cepa da videira. A seiva, isto é, o Espírito Santo, vem da cepa para os ramos, tornando-os fecundos. Como ramos da videira, nós temos de estar sempre unidos à cepa. Sem esta união nós não podemos dar qualquer fruto, pois sem Cristo nada podemos fazer (Jo 15, 4-6).

Com seu jeito maternal de amar, o Espírito Santo vai-nos incorporando na Família de Deus, conduzindo-nos ao Pai que nos acolhe como filhos e ao Filho que nos acolhe como irmãos (Rm 8, 14-16). São Paulo diz que o Espírito Santo é o amor de Deus derramado nos nossos corações (Rm 5, 5).

João começa o seu evangelho afirmando que Cristo é a Palavra, isto é, a verdade. A Bíblia diz que a Palavra de Deus é eficaz, ou seja, realiza sempre o que significa. O Filho vem como Palavra, isto é, proclamação do amor salvador de Deus por nós. Eis a razão pela qual o Verbo Encarnou e habitou entre nós, dando-nos o poder de nos tornarmos filhos de Deus (Jo 1,12-14).

Depois de ter realizado a sua missão o Filho volta para junto do Pai, a fim de nos introduzir na Família Divina: “Eu saí do Pai e vim para o mundo. Agora deixo o mundo e vou para o Pai” (Jo 16, 28). Depois acrescenta: “Nesse dia compreendereis que eu estou no Pai, vós em mim e eu em vós” (Jo 14, 20). Quem via o modo de actuar do Filho estava a ver o próprio jeito do Pai nos amar. Quem me vê, disse Jesus a Filipe, vê o Pai (Jo 14, 9).

Tomé, no evangelho de São João, chama Deus a Jesus ressuscitado. Depois de ver o Senhor, Tomé declara: “Meu Senhor e meu Deus” (Jo 20, 28). Além disso, o próprio Jesus se declara Deus, usando a mesma expressão que Yahvé usou no Monte Sinai: “Agora digo-vos estas coisas antes que aconteçam, a fim de que, quando elas acontecerem, acrediteis que eu sou” (Jo 13, 19). Por outro lado, como é um homem em tudo igual a nós, excepto no pecado, Jesus reconhece que vai para junto do seu Pai e nosso Pai, do seu Deus e nosso Deus” (Jo 20, 17).


4- Cristo é Homem Connosco e Deus com o Pai

Devido à sua condição divina, o Filho é igual ao Pai. Mas devido à sua condição de homem, o Pai é maior do que o Filho: “Ouvistes o que eu vos disse: “Eu vou mas voltarei para vós”. Se me tivésseis amor, devíeis alegrar-vos por eu ir para o Pai, pois o Pai é mais do que eu” (Jo 14, 28).

O evangelho de São João diz que os judeus, ao notarem que Jesus se fazia igual a Deus, ficaram furiosos e decidiram matá-lo: “Devido ao facto de Jesus realizar estes prodígios em dia de sábado, os judeus começaram a perseguí-lo. Em resposta, Jesus disse-lhes: “O meu Pai continua a realizar obras até agora, e eu também continuo!” Perante tais afirmações, mais cresceu neles o desejo de o matarem, pois não só anulava o sábado, como chamava a Deus seu Pai, fazendo-se, deste modo, igual a Deus” (Jo 5, 16-18).

Podemos dizer que a compreensão de Cristo como Filho Eterno de Deus não foi o ponto de partida, mas sim o ponto de chegada da caminhada da revelação. Com efeito, compreender o mistério de Cristo com este alcance supõe um salto de qualidade enorme, muito além do que os judeus podiam esperar do Messias.

Na verdade, reconhecer que Cristo é o Filho eterno de Deus implica afirmar que Deus não é apenas o Yahvé do Antigo testamento, mas sim uma comunidade familiar: “Não acreditais que eu estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo não são ditas por minha própria iniciativa. O Pai que habita em mim é que faz as obras. Acreditai que eu estou no Pai e o Pai está em mim. Pelo menos acreditai por causa das minhas obras” (Jo 14, 10-11).

A fidelidade incondicional de Jesus à missão que Deus lhe confiou é, pois, a fonte da Salvação para a Humanidade. Eis a razão pela qual ele procurava fazer as coisas tal como o Pai lhe mandou: “Pois eu não falei por mim mesmo, mas o Pai, que me enviou, é que me comunicou o que devo dizer. E eu sei que o seu mandamento traz consigo a vida Eterna. Eis a razão pela qual eu digo exactamente o que o Pai me disse para dizer” (12, 49-50).

Por fazer um com o Pai, o Filho é igualmente fonte de vida: “Assim como o Pai tem vida por si mesmo, também o Filho tem vida em si mesmo” (Jo 5, 26). Jesus diz isto de modo mais explícito quando afirma: “Eu sou a Ressurreição e a Vida. Quem crê em mim, mesmo que tenho morrido, viverá. Todo aquele que vive e crê em mim não morrerá para sempre” (Jo 11, 25-26).


e) Quando a Vida Fica Sem Sentido

Chamavam-lhe a Isabel do Outeiro. Caminhava sozinha e sempre vestida de preto. Chegava, abria a porta da casa escura e fria e, com um olhar furtivo, espreitava para dentro da daquela casa sem vida. Em seguida saía, fechava a porta e voltava pelo mesmo caminho que percorrera para chegar ali. Todos os dias, à mesma hora, a Isabel repete aquele ritual. Age como quem deseja encontrar alguém que não encontra ou realizar algo que não é possível realizar.

Ficou viúva três anos depois de casar. Ficou com um filho encantador, ao qual dedicou toda a sua vida. O rapaz estava a ficar um homem. A Isabel projectava neste filho um sem número de ilusões. Estava prestes a completar dezoito anos. A Isabel vivia com o filho na casa onde vivera com o marido. O filho ajudou-a em grande parte a superar o drama da viuvez.

Mas eis que de repente, numa noite escura triste, tudo se alterou: um acidente brutal vitima a vida do seu filho. A Isabel ficou sem razões para viver. Deixou a casa onde viveu com o marido e o filho e foi para casa dos seus pais. Após o funeral do seu filho, a porta daquela casa enlutada fechou-se. Agora, abre-se de modo ritual todos os dias e à mesma hora.

Todas as tardes, ao sair do trabalho, a Isabel vai à sua casa: abre a porta, espreita para dentro da casa e escuta uns momentos. Depois, fecha a porta e vai-se pensativa, triste com um olhar vago e triste. Ao realizar o ritual obsessivo compulsivo, a Isabel como que pretende encontrar aqueles que eram a sua razão de viver e lhe faltaram para sempre.

Não conseguiu integrar na sua história pessoal o drama terrível da perda daqueles que mais amava. Recusa-se a ouvir conselhos ou aceitar consolações e conforto de alguém. Gasta-se a trabalhar e a cuidar dos pais já muito idosos. Viver ou morrer, diz ela à mãe, é-lhe indiferente. Depois acrescenta: “A vida é demasiado dura para ser amada”.

Quando caminha de olhar vago e indiferente para as pessoas que se cruzam com ela, a Isabel gosta de ir até ao cais. Aí, senta-se silenciosa e triste. Parece a viúva de um pescador cujo barco se afundou com o marido e o filho. É como se continuasse teimosamente a aguardar a chegada do marido e do filho no barco que se vislumbra no horizonte.

Passados cerca de vinte minutos, a Isabel levanta-se e volta para a casa dos seus pais. Acontece-lhe frequentemente parar e olhar para um jovem com o qual se cruzou e que, de repente, lhe deu a sensação de ser o seu filho. Depois segue profundamente magoada com a vida. Por vezes suspira fundo e grita: porquê? A Isabel não teve a sorte de encontrar alguém que lhe comunicasse o dom da fé. A luz da fé ajuda a dar sentido aos acontecimentos, capacitando a pessoa para os saber integrar na sua vida.

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