Eucaristia e o Sangue da Nova Aliança



a) A Carne e o Sangue de Cristo
b) O Espírito Santo é o Sangue da Nova Aliança
c) Eucaristia e Dinâmica da Salvação


a) A Carne e o Sangue de Cristo

O Senhor Jesus presente e actuante na Eucaristia é o Senhor ressuscitado. Isto quer dizer que a carne e o sangue de Jesus Cristo são uma realidade grandeza espiritual e não biológica. O evangelho de São João é o mais explícito neste particular, afirmando que a Carne e o Sangue e o Sangue de Cristo se refere ao Senhor ressuscitado.

Trata-se do princípio vital de Cristo ressuscitado, isto é, do Espírito Santo. Eis as suas palavras: “Isto escandaliza-vos? E se virdes o Filho do Homem subir para onde estava antes? O Espírito é que dá vida, a carne não serve para nada. As palavras que vos disse são Espírito e Vida (Jo 6, 62-63).

Comer a Carne de Jesus Cristo e beber o seu sangue, na Eucaristia, significa abrir o coração ao Espírito Santo, o qual nos configura com o próprio Jesus ressuscitado. Como sabemos, os sacramentos são eficazes na medida em são espaços para o Espírito Santo agir e acontecer a Palavra de Deus.

Falar da Carne e sangue de Jesus Cristo ressuscitado é afirmar a sua condição de homem glorificado e incorporado, pelo Espírito Santo, na comunhão da Santíssima Trindade. Comer a Carne e beber o Sangue do Senhor ressuscitado é acolher e deixar-se moldar pelo Espírito Santo, a força vital que incorpora e alimenta o homem Jesus na comunhão familiar da Santíssima Trindade.

O Espírito Santo realiza este mesmo mistério em nós na medida em que formamos um todo orgânico com Jesus Cristo: “Permanecei em mim que eu permaneço em vós. Tal como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, mas só permanecendo na videira, assim também acontecerá convosco, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira, vós os ramos. Quem permanece em mim e eu nele, esse dá muito fruto, pois sem mim nada podeis fazer” (Jo 15, 4-5).

O Espírito Santo foi a força ressuscitante de Jesus Cristo. Na verdade, a ressurreição e a morte de Jesus aconteceram de modo simultâneo. À medida em que, na cruz, ia morrendo em Jesus o que no homem é mortal, aquilo que no homem é imortal, ia sendo glorificado e incorporado na Comunhão da Santíssima Trindade. No momento em que, em Jesus, morreu o último elemento daquilo que no homem é mortal, aquilo que no homem é imortal fica plenamente ressuscitado.

Por outras palavras, Jesus Cristo venceu a morte no próprio acto de morrer. O que ressuscita é o espiritual, não o biológico. Por isso é que, segundo o evangelho de São Lucas, Jesus disse ao Bom Ladrão que nesse mesmo diz se encontrariam no Paraíso, isto é, na festa do Reino que é comunhão dos ressuscitados em Cristo (Lc 23, 43).

No evangelho de São Mateus as imagens utilizadas exprimem ainda melhor a simultaneidade da morte e ressurreição de Jesus. Eis o que aconteceu no momento da morte e ressurreição de Jesus segundo São Mateus: “Abriram-se os túmulos e muitos corpos de santos, que estavam mortos, ressuscitaram” (Mt 27, 52).

A Eucaristia, como sacramento, é uma celebração comunitária da Fé que proclama a morte e ressurreição de Jesus Cristo e a nossa participação nesta mesma ressurreição. São Paulo diz que os membros da comunidade comem todos do mesmo pão, a fim de formarmos o Corpo de Cristo, condição fundamental para ressuscitarmos com ele (1 Cor 10, 17; 12, 17). Mas isto acontece pela acção do Espírito Santo, continua São Paulo. Na verdade, fomos baptizados no mesmo Espírito, a fim de formarmos um só Corpo seja qual for a raça, a nacionalidade, a condição social ou sexual (1 Cor 12, 12-13).

O evangelho de São João diz expressamente que aqueles que comem a carne de Jesus e bebem o seu sangue participam da mesma ressurreição do Senhor: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna e eu vou ressuscitá-lo no último dia” (Jo 6, 54). É verdade que, após a sua ressurreição, Jesus Cristo mantém a sua identidade histórica como acontece com os demais ressuscitados em Cristo. Mas não devemos confundir a identidade histórica de Jesus ressuscitado com a sua condição biológica anterior à morte. Jesus ressuscitado é um ser totalmente espiritual. São Paulo diz que o Senhor ressuscitado já não morre mais (Rm 6, 9).

O Espírito Santo é a Água Viva que gera Vida Eterna no seu interior (Jo 7, 37.39; cf. 4, 14). Ele é a força vital que ressuscitou Jesus e nos ressuscita com ele. Com o seu jeito maternal, o Espírito Santo incorpora-nos na Família de Deus como filhos de Deus Pai e irmãos de Deus Filho (Rm 8, 14-16).

Comer a carne de Jesus ressuscitado e beber o seu sangue é, portanto, acolher o Espírito que alimenta a nossa união orgânica com Cristo e nos incorpora na Família de Deus. Os que comem a carne do Senhor ressuscitado e bebem o seu sangue fazem uma união idêntica à que existe entre Deus Pai e seu Filho.

É isto que Jesus nos diz no evangelho de São João: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue fica a morar em mim e eu nele. Assim como Pai que me enviou vive, e eu vivo pelo Pai, também aquele que me come viverá por mim” (Jo 6, 56-57). Esta união orgânica com Cristo é dinamizada pelo Espírito Santo, condição para que sejamos ramos vivos e fecundos como o evangelho de São diz na alegoria da videira (Jo 15, 4-5).

Segundo a linguagem sacramental da Eucaristia, a união que nos liga de modo orgânico a Cristo acontece no nosso interior. É este o significado profundo associado ao acto de comer o pão e beber o vinho eucarístico. Ao ressuscitar, Cristo passou da face exterior da realidade para a sua face interior, isto é, para a dimensão na qual acontece a Comunhão Universal.

Por outras palavras, a face interior é constituída pelas coordenadas de Deus isto é, a universalidade e a equidistância. As pessoas humanas, mediante o acontecimento da morte, passam da face exterior para a face interior, ficando assim nas mesmas coordenadas de Deus. Por outras palavras, os nossos seres queridos que, através da morte, passaram para as coordenadas da interioridade máxima da realidade, não estão longe.

Com efeito, nas coordenadas da Universalidade e da equidistância já não há lonjura, mas sim omnipresença a tudo e a todos. É esta a morada de Deus. É verdade que a nossa interioridade pessoal-espiritual e a interioridade na qual Deus habita não coincidem, pois Deus é transcendente. Mas não há distância a separar-nos. Com efeito, aí onde termina a nossa interioridade espiritual limitada começa a interioridade ilimitada da Comunhão Universal cujo coração é a Santíssima Trindade.

É por isto que podemos dizer com São Paulo que o Espírito Santo habita no nosso coração, pois ele é o Amor de Deus derramado nos nossos corações (Rm 5, 5). Do mesmo modo, quando dizemos que, pela Encarnação, o Filho de Deus veio até nós, não estamos a afirmar que se deslocou de um sítio para outro.

A dinâmica da Encarnação não pressupõe a transposição de uma distância, pois tal não existe. Pela encarnação aconteceu uma interacção directa entre a interioridade espiritual humana de Jesus de Nazaré e a interioridade espiritual divina da segunda pessoa da Santíssima Trindade. Esta interacção é dinamizada pela pessoa do Espírito Santo cujo jeito de ser é animar relações de reciprocidade amorosa e fortalecer os vínculos de união orgânica entre as pessoas. É este o sentido profundo da afirmação do credo segundo a qual o Filho de Deus encarnou pelo Espírito Santo. A Encarnação é o enxerto do divino no humano, a fim deste poder ser divinizado. O Reino de Deus universalizou-se com o acontecimento da ressurreição de Jesus (Jo 7, 37-39).

Antes da morte e ressurreição de Jesus Cristo, o Reino de Deus estava no meio dos homens, pois a dinâmica da união humano-divina existia apenas no interior de Jesus. No momento da sua ressurreição, a Humanidade fica capacitada para interagir organicamente com o Espírito Santo Espírito Santo através de Jesus, pois ele já está nas coordenadas da Universalidade e da equidistância. Nesse momento, o Reino de Deus deixou de estar no meio dos homens para passar a estar no seu íntimo.

É tudo isto que a Eucaristia celebra e proclama, de modo particular o gesto sacramental da comunhão da carne e sangue de Jesus. Segundo o evangelho de São João, o próprio Jesus afirma que a sua carne e o seu sangue é o Espírito Santo que nos é comunicado, graças à sua ressurreição (Jo 6, 62-63). Por outras palavras, o Reino de Deus, enquanto união orgânica de grandeza humano-divina, começou a emergir no coração de Jesus Cristo. Universalizou-se e tornou-se interior em relação a todos os seres humanos no momento da morte e ressurreição de Jesus. Por isso, enquanto Jesus viveu no meio dos seres humanos, o Reino de Deus estava no meio das pessoas, constituindo-se como interioridade máxima de toda a realidade no momento da sua ressurreição.

Como vemos, a essência e a dinâmica da Eucaristia é de tipo espiritual e não é de tipo biológico. O corpo dos ressuscitados, diz São Paulo, é espiritual, não biológico (1 Cor 15, 42-45). Se nós somos baptizados no Espírito Santo é para formarmos o corpo de Cristo, isto é, uma união espiritual com o Senhor (1 Cor 12, 12-13). A carne e o sangue entendidos como grandeza biológica não fazem parte do Reino de Deus (1 Cor 15, 50).


b) O Espírito Santo é o Sangue da Nova Aliança

A Nova Aliança leva consigo uma recriação do Homem operada pelo Espírito Santo. Por outras Palavras, a Nova Aliança implica nascer de novo, graças à acção geradora do Espírito Santo (Jo 3,6). Eis as palavras da Carta aos Efésios sobre o pleno de Deus a propósito do Homem Novo: “Deus escolheu-nos em Cristo antes da fundação do mundo, a fim de sermos santos e irrepreensíveis na sua presença e vivermos no amor. Predestinou-nos para sermos adoptados como seus filhos por meio de Jesus Cristo, de acordo com a sua vontade” (Ef 1, 4-5).

Este plano esteve oculto durante milénios, mas foi dado a conhecer quando chegou a plenitude dos tempos: “Agora podeis fazer uma ideia da compreensão que tenho do mistério de Cristo, o qual não foi dado a conhecer aos filhos dos homens, em gerações passadas, como agora foi revelado aos seus santos Apóstolos e Profetas pelo Espírito Santo” (Ef 3, 4-5).

A Nova Aliança, portanto, representa a plenitude de um projecto sonhado por Deus desde toda a eternidade. A Antiga Aliança aparece, pois, como um passo fundamental para a chegada da Nova.
É o sinal da acção pedagógica do Espírito Santo que foi preparando a Humanidade para a plenitude dos tempos, a qual implica a incorporação da Humanidade (judeus e pagãos) no único Reino de Deus: “Com efeito, Cristo é a nossa paz. De dois povos (judeus e pagãos) fez um só, anulando o muro da separação que os dividia: a Lei Mosaica com suas leis, normas e preceitos, a fim de criar um só Homem Novo com judeus e pagãos. Portanto, já não sois estrangeiros nem imigrantes, apesar de pagãos, mas concidadãos dos santos e membros da Família de Deus” (Ef 2, 14.19).

O Novo Testamento apresenta uma série de conceitos e imagens que reforçam a ideia de que a Antiga Aliança estava em Função da Nova: “Antes de chegar a plenitude da Fé estávamos prisioneiros da Lei Mosaica. Era necessário que a Fé se revelasse. Deste modo, a Lei tornou-se nosso pedagogo até Cristo, a fim de sermos justificados pela Fé. Agra já sois filhos de Deus, por isso não estais sob o domínio do pedagogo (…). Já não há judeu ou grego. Não há escravo ou homem livre. Não há homem ou mulher, pois todos sois um só em Cristo Jesus” (Ga 3, 23-29).

A antiga Aliança tinha como alicerce a Lei Mosaica, a qual se multiplicava em normas, preceitos, mandamentos e rito que não levavam à salvação. A Nova Aliança tem como alicerce o dom do Espírito, o qual realiza em nós a obra da salvação, incorporando-nos na Família de Deus: “Todos os que são movidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus” (Rm 8, 14). Viver a dinâmica da Nova aliança significa deixar-se conduzir pelo Espírito Santo: “Eis os frutos do Espírito: amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, auto-domínio. Contra tais coisas não há lei” (Ga 5, 22).

A Nova Aliança supõe, não propriamente uma rotura com a Antiga, pois a Antiga era um degrau para chegar à Nova. A Antiga Aliança foi superada da mesma maneira que as metas para atingir um objectivo determinado são superadas quando o objectivo é atingido. A Nova Aliança não é uma simples continuidade em relação à Antiga, tal como Cristo não está apenas numa linha de continuidade em relação a Moisés. Pelo contrário, a Nova Aliança representa um salto de qualidade em relação à Antiga. Com efeito, a libertação e a divinização do Homem realizada pela Encarnação, não está numa simples continuidade em relação à libertação dos hebreus da escravidão do Egipto.

Não é difícil compreender como entre estes dois acontecimentos existe uma diferença qualitativa. A libertação realizada pela Nova aliança tem o alcance de uma salvação definitiva que implica a assunção e incorporação da humanidade na Família Divina (Jo 1, 12-14). Este projecto eterno, diz a Carta aos Efésios, foi realizado em Jesus Cristo, nosso Senhor (Ef 3, 11).

Deus planeou a salvação da Humanidade, continua a mesma carta, ainda antes da criação do Mundo (Ef 1, 4). O Reino que havemos de herdar com Cristo foi preparado para nós, diz o Evangelho de Mateus, desde a Criação do Mundo (Mt 25, 34). O plano salvador que Deus sonhou para nós, diz a Segunda Carta a Timóteo, foi concebido desde os tempos primordiais (2 Tim 1, 8-9).

Este plano de salvação, foi oculto a muitos profetas e reis da antiguidade, mas foi revelado pelo Espírito Santo quando chegou a plenitude dos tempos: “Nesse mesmo instante, Jesus estremeceu de alegria sob a acção do Espírito Santo e disse: “Bendigo-te ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelastes aos pequeninos. Sim, Pai, porque foi do teu agrado. Tudo me foi entregue por meu Pai e ninguém conhece quem é o Filho senão o Pai, nem quem é o Pai senão o filho e aquele a quem o filho houver por bem revelar-lho”. Voltando-se depois para os discípulos disse-lhes: “Felizes os olhos que vêem o que estais a ver. De facto, digo-vos eu, muitos profetas e reis quiseram ver o que vedes e não o viram, ouvir o que ouvis e não o ouviram!” (Lc 10, 21-24).

Como vemos, o projecto da Nova Aliança é anterior ao plano da Antiga, pois esta foi concebida como meio para a plenitude da Nova Aliança. A Carta aos Hebreus diz que Deus ao falar de uma Nova Aliança declarou obsoleta a Antiga. Como o que se torna obsoleto está prestes a desaparecer, assim acontece com a Antiga Aliança (Heb 8, 13).

No livro do profeta Ezequiel aparece Deus a prometer ao povo uma Nova aliança. Ao lembrar-se da Antiga Aliança, Deus vai fazer uma Nova que será definitiva: “Lembrar-me-ei da Aliança que fiz contigo, no tempo da tua juventude e estabelecerei contigo uma aliança Eterna (…). Estabelecerei contigo a minha Aliança e então saberás que eu sou o Senhor, a fim de que te lembres de mim e sintas vergonha e não abras mais a boca no Meio da tua confusão, quando eu te perdoar tudo o que fizestes, oráculo do Senhor” (Ez 16. 60-63).

Segundo o profeta Jeremias, a Nova aliança assenta em novos alicerces: num coração renovado e no dom do Espírito Santo: “Dias virão em que estabelecerei uma Nova aliança com a casa de Israel e a casa de Judá, oráculo do Senhor. Não será como a Aliança que estabeleci com seus pais, quando os tomei pela mão para os fazer sair da terá do Egipto, aliança que eles não cumpriram, embora eu fosse o seu Deus, oráculo do Senhor. Esta será a aliança que estabelecerei depois desses dias com a casa de Israel, oráculo do Senhor: “Imprimirei a minha Lei no seu íntimo e gravá-la-ei no seu coração. Serei o seu Deus e eles serão o meu povo.” (Jer 31, 31-33).

A Nova Aliança, portanto, não é escrita em tábuas de pedra, como a Antiga. Pelo contrário, será escrita no coração das pessoas. São Paulo diz aos membros a comunidade de Corinto que eles são uma carta de Cristo, escrita pelo Espírito Santo, pois pertencem à Nova Aliança: “A nossa carta sois vós, uma carta escrita nos nossos corações, conhecida e lida por todos os homens. Sois uma carta de Cristo confiada ao nosso ministério, escrita, não com tinta, mas com o Espírito de Deus vivo. Escrita, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne que são os vossos corações (…). É Deus que nos torna aptos para sermos ministros de uma Nova aliança, não da letra, mas do Espírito, pois a letra mata, enquanto o Espírito dá vida” (2 Cor 3, 2-6).

Em Cristo, o medianeiro da Nova Aliança, nós somos uma Nova Criação reconciliada com Deus: “Se alguém está em Cristo é uma Nova Criação. Passou o que era velho. Eis que tudo se fez novo. E tudo isto vem de Deus que, em Cristo, nos reconciliou consigo, não levando mais em conta os pecados dos homens” (2 Cor 5, 17-19). Segundo o plano da Nova Aliança nós recebemos o dom do Espírito Santo através de Cristo ressuscitado. Uma vez capacitados para interagir intrinsecamente com o Espírito Santo começamos a ser configurados com o mesmo Cristo, pelo que ele se torna o primogénito de muitos irmãos (Rm 8, 29).


c) Eucaristia e Dinâmica da Salvação

A Eucaristia é o presente magnífico que Jesus nos deixou como sacramento que explicita o dinamismo da salvação a actuar no nosso íntimo. Em primeiro lugar proclama a união orgânica de Cristo com a Humanidade, graças à qual somos assumidos e incorporados na Família Divina. Depois explicita que a dinâmica da Salvação está a acontecer no nosso coração.

Louvado sejais, Senhor Deus, pelo acontecimento da Salvação e pela sua dinâmica a acontecer em nós, graças à acção do Espírito Santo. Ao ressuscitar, Jesus passou da face exterior da realidade para a sua face interior, isto é, para a dimensão na qual acontece a Comunhão Universal do vosso Reino!

Deus habita na face interior da realidade essa dimensão transcendente cujas coordenadas são a universalidade, a equidistância e a comunhão amorosa. Através da sua ressurreição, Jesus Cristo venceu a morte para si e para nós Na véspera da sua passagem para a morada de Deus, Jesus garantiu-nos que nós habitaríamos para sempre com ele na Festa da Vida Eterna. Deste modo temos a garantia de possuirmos uma habitação eterna na comunhão Universal do Reino de Deus.

Eis as palavras da promessa de Jesus, no final da Ceia de despedida que ele realizou com os discípulos e na qual instituiu o grande dom da Eucaristia: "Não vos deixarei órfãos, pois eu voltarei a vós (...). Nesse dia compreendereis que eu estou no meu Pai, vós em mim e eu em vós" (Jo 14, 18-20).

Esta maneira de falar de Jesus exprime de modo muito claro a dinâmica da Salvação como comunhão orgânica. O próprio Jesus, no evangelho de São João, explicita esta união orgânica connosco dizendo que ele é a cepa da videira da qual nós somos os ramos. Só podemos viver e ser fecundos se permanecermos unidos à cepa (Jo 15, 4-5).

A promessa de Jesus também nos dá a certeza de que os nossos seres queridos que, pela passagem da morte, participam definitivamente na ressurreição com Cristo estão perto de nós. Com efeito, nas coordenadas da universalidade e da equidistância, já não há lonjura, mas sim omnipresença a tudo e a todos. Esta omnipresença acontece a partir da interioridade máxima de toda a realidade. Tudo isto quer dizer, portanto, que não distância nem lonjura entre nós e a Comunhão Universal da Comunhão Universal que constitui a Família de Deus!

Com efeito, no ponto onde termina a nossa interioridade espiritual limitada começa a interioridade espiritual ilimitada da Comunhão Universal do Reino de Deus. O animador desta Comunhão Orgânica Universal é o Espírito Santo. Ele é o Amor de Deus derramado nos nossos corações, como diz a Carta de São Paulo aos Romanos (Rm 5, 5).

Ele é mais íntimo a nós que nós próprios, pois torna-se presente a nós a partir das coordenadas da Comunhão Universal do Reino. Eis a razão pela qual ele está sempre à porta do nosso coração. Sempre que, pela Fé e pelo Amor, abrimos a porta, o Espírito Santo introduz-nos na onda da Comunhão Universal do vosso Reino.

Com a ressurreição de Cristo acontece realmente a Nova Criação reconciliada com Deus em Cristo, como diz São Paulo (2 Cor 5, 17-19). Este dom teve início com o mistério da Encarnação e atingiu a sua plenitude com a ressurreição de Cristo. Através da Encarnação, o Divino enxertou-se no Humano, a fim de este ser divinizado. No momento em que Jesus ressuscita, a dinâmica do Natal que até então habitava apenas o coração de Jesus, passou a habitar o coração de todos os seres humanos que vivem a comunhão orgânica universal.

A Salvação consiste, pois na divinização da Humanidade, a qual acontece pela incorporação das pessoas humanas na Comunhão da Santíssima Trindade, na qual somos assumidos como filhos em relação a Deus Pai e como irmãos em relação a Deus Filho. Como podemos ver, os dois pilares da dinâmica da Salvação são, pois, o Natal e a Páscoa. A seiva que vivifica e robustece esta união humano-divina é o Espírito Santo, o Sangue da Nova e Eterna Aliança. É este mistério que os cristãos celebram na Eucaristia, de modo particular no rito da comunhão do Pão e do Vinho consagrados.

Nesse momento, os crentes exprimem e procuram reforçar esta união orgânica com o Senhor, a fim de robustecer o Corpo de Cristo do qual são membros. Eis as palavras de São Paulo a este respeito: "Comemos do mesmo pão porque fazemos um só Corpo" (1 Cor 10, 17). A Carne e o Sangue de Jesus ressuscitado é o Espírito Santo, o qual alimenta a vida eterna a emergir e a fortalecer-se no nosso coração. Por outras palavras, alimentando-nos da carne e sangue do Senhor ressuscitado nós tornamo-nos participantes da ressurreição de Cristo.

Segundo o evangelho de São João foi exactamente isto que Jesus disse quando afirmou: "Quem come a minha carne e bebe o meu sangue fica a morar em mim e eu nele. Assim como o Pai que me enviou vive e eu vivo pelo Pai, assim também aquele que come a minha carne e bebe o meu sangue viverá por mim" (Jo 6, 56-57). Ao comerem o pão e beberem o vinho da Eucaristia, os cristãos estão a proclamar que é no interior da pessoa humana que acontece a união e a interacção que nos diviniza, incorporando-nos na Comunhão da Santíssima Trindade.

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