Construíndo a Família Cristã (IV)


e) Sonhando a Família Ideal

 

 

A família ideal transcende a rigidez do modelo patriarcal. Isto não significa a diminuição da autoridade paternal, mas apenas que a autoridade não é exercida em forma de pirâmide cujo vértice é o pai e a base são os filhos.


Neste modo novo de viver a comunhão familiar, a autoridade é dialogante e circular. As relações são verdadeiramente interacções amorosas, o que facilita uma maior maturidade das pessoas, pois estas sentem-se tomadas a sério. Conviver é interagir de modo livre, consciente, e responsável. As pessoas são aceites e estimadas na sua condição de pessoas únicas, originais irrepetíveis. Ninguém pretende fazer passar os outros por um molde preconcebido, pois todos entendem que as pessoas não são peças de artesanato feitas em série.

Como membros deste modelo de família amadurecida, as pessoas têm consciência dos seus direitos e deveres. Todos entendem o que é a dignidade da pessoa. Todos sabem que comunhão não significa fusão ou anulação das diferenças pessoais. Nesta família, as pessoas entendem que o amor não é uma questão de sentimentos, mas uma dinâmica de bem-querer que se concretiza em atitudes de serviço e atenção aos outros.  Na verdade, amar implica actos e atitudes concretas. A comunhão é o fruto mais amadurecido desta vivência familiar.

De facto, o amor é uma dinâmica de bem-querer que tem como origem as pessoas e como meta a comunhão. As pessoas elegem-se mutuamente como alvo de bem-querer, aceitando-se assim como são, apesar de serem diferentes umas das outras. As pessoas compreendem que o amadurecimento humano implica a capacidade de agir de modo a facilitar a realização e felicidade dos outros.

Os filhos aprendem a ser responsáveis pelas tarefas que lhe são atribuídas. Todos sentem que as pessoas são iguais, não por serem coisas feitas em série, mas por terem a mesma dignidade. Esta família é uma verdadeira comunidade onde há papéis, funções e missões diferentes a realizar. Não pode haver família equilibrada sem autoridade, mas aqui, a autoridade realiza-se em diálogo e não como um poder arbitrário e caprichoso. Como as pessoas se sentem estimadas e valorizadas no que fazem, realizam as tarefas com agrado.

A família ideal é um espaço de relações abertas à novidade de cada um. Tanto os pais como os filhos sabem que cada pessoa é um ser único, original e irrepetível. Todos têm condições para emergir na sua unicidade pessoal e sentir-se felizes por serem assim como são.

Nesta família emergem pessoas verdadeiramente livres, pois a liberdade é a capacidade de se relacionar amorosamente com os outros e de interagir criativamente com as coisas e os acontecimentos. Eis a razão pela qual, na família ideal, não há pessoas desenquadradas ou marginalizadas, pois cada um é chamado a agir e cooperar na medida das suas possibilidades e talentos. Ninguém desvaloriza a cooperação do outro só por esta ser pequena ou mínima.

A família ideal é um espaço privilegiado para emergirem pessoas verdadeiramente felizes. Nesta família ninguém cultiva a mediocridade, também ninguém se demite da missão que lhe foi atribuída. Eis a razão pela qual os membros desta família são pessoas verdadeiramente responsáveis. Esta família é um dom de Deus à Humanidade, pois é um alfobre de excelentes obreiros de uma sociedade melhor.

Os membros desta família têm sentidos e razões para viver. É notório o seu jeito alegre de viver e se relacionar. Não há pessoas vazias, isto é, seres sem objectivos e metas para atingir. O contributo de cada um é estimado por todos. Na família ideal não há cobardes nem heróis. Todos sabem que os talentos de cada um são dons que Deus nos dá através dos outros. O nosso mérito consiste em fazer render esses talentos.

Procedendo assim, as pessoas realizam-se e possibilitam a realização dos outros. Todos tomam parte naquilo que a todos diz respeito. Para que isto seja possível, há momentos de encontro para elaborar projectos e tomar decisões em clima de diálogo. De tempos a tempos há momentos de revisão, a fim de se tomar consciência do modo como se está a realizar o que ficou decidido e programado em conjunto. Quando as circunstâncias o aconselham, altera-se o que estava programado. Ninguém se sinta excluído.

As pessoas compreendem que a meta é alimentar e fazer crescer sempre mais a comunhão familiar. Os mais novos vão aprendendo que a união e comunhão familiar não são inimigas da felicidade e da realização de cada um. A família ideal é realmente um canteiro privilegiado para acontecer a humanização das pessoas.

Nesta família há espaços para o trabalho, o encontro, o convívio. Há tempos para receber os amigos e tempos para o descanso, condição importante para que a vida das pessoas tenha qualidade. Todos gostam de colaborar para que haja verdadeiramente uma alegria partilhada.

Aprender, nesta família, não é tarefa aborrecida, pois a regra básica na tarefa de ensinar e aprender é o amor. As pessoas sentem-se livres para pensar e falar. Mas também conhecem a importância de escutar os outros com atenção. A autoridade dos pais jamais se anula. Mas esta autoridade nunca cai na arbitrariedade e muito menos em situações de injustiça. Compete aos pais estar atentos e chamar a atenção no sentido de se cumprir o que foi programado tal como os horários para as refeições e o descanso, tempos de trabalho, critérios para receber os amigos, realização das tarefas, etc.

Nesta família existe uma coisa muito bonita: todos são capazes de se olharem nos olhos e sorrir uns para os outros. No olhar e no modo de sorrir dos membros da família ideal nota-se que a transparência é o alicerce da verdade e da lealdade. A família ideal não acontece de modo espontâneo. É uma tarefa que se realiza com decisões, escolhas, opções e compromissos.

Os mais novos sentem-se livres e motivados para participar, pois sabem que são tomados a sério, seja qual for o seu grau de crescimento e maturidade. Mas ninguém se esquece da sua condição de pessoa em realização. Todos tomam a sério a questão do seu crescimento pessoal e do crescimento dos outros. Como as pessoas sentem que os outros são um dom de Deus para si, procuram igualmente ser um dom de Deus para os outros.

Na família ideal realiza-se verdadeiramente a dinâmica sacramental do matrimónio, pois visibiliza e explicita para o mundo o mistério de Deus que é uma família de três pessoas em comunhão de amor infinitamente perfeito. Devido aos diálogos e encontros de programação e decisão, nesta família existe um objectivo comum para o qual todos procuram convergir.

Na família ideal não há homens ou mulheres “faz tudo”.  Isto deforma e incapacita os filhos para, por seu lado, virem a construir uma família feliz. É melhor todos a fazer pouco, que apenas um ou dois a fazer tudo. A família ideal é a rocha sólida e firme sobre a qual se pode edificar com segurança o edifício da nova humanidade.


f) O Pedrito sonha com uma Família Feliz

O Pedrito não se sente feliz apesar de os pais terem muito dinheiro. Na verdade, ele só usa roupas de marca e conjunto fabuloso brinquedos sofisticados e muito caros. Mas o Pedrito inveja a maneira de viver da família da Rita, apesar desta não ter muito dinheiro.

Certo dia, pensando na família da Rita, o Pedrito pôs-se a sonhar sobre uma família feliz. Sonhou e descobriu os passos importantes para isso acontecer: para ele a felicidade familiar assenta sobre uma série de coisas simples como, por exemplo, sentir-se bem em casa. Mas isto só pode acontecer se existir colaboração entre os membros da família, amabilidade, capacidade de se olharem com ternura e de brincarem uns com os outros.

Para a pessoa se sentir bem em casa tem de haver harmonia nas relações entre pai, mãe e filhos diz o Pedrito. Ele tem uma fome enorme de carinho. Sente-se muito feliz quando os pais o abraçam e lhe dão miminhos. Mas isto acontece muito raramente. Na casa da Rita, diz o Pedrito, as pessoas tocam-se, brincam umas com as outras e trocam abraços entre si.

Nos dias em que há uma festa especial, a mãe da Rita acende uma vela para o jantar. Deste modo aquela casa fica cheia de um ambiente especial que tem sabor a carinho e ternura. Isto faz com que as pessoas se sintam muito felizes. Na casa da Rita, as pessoas ajudam-se umas às outras nos trabalhos de casa. Todos colaboram, embora cada qual com as suas possibilidades.

Em certos dias fazem bolos em conjunto, sobretudo aquelas guloseimas de que mais gostam. Estes bolos sabem muito melhor do que os bolos muito enfeitados que vêm da pastelaria. Nos dias de festa, aquela casa fica toda a cheirar a coisas boas. A Rita fica muito feliz quando o pai a atira ao ar e desalinha os seus cabelos.

O Pedrito também gostava que o seu pai brincasse com ele. Gostava muito, diz ele, de poder jogar com o meu pai e brincar com a minha mãe, mas isso quase nunca acontece. A Rita diverte-se muito quando vê o pai a brincar com a mãe. Nesses momentos sente-se muito feliz, corre para junto dos pais e mete-se no meio.

À noite, os pais da Rita têm quase sempre uns momentos para falar com ela. Depois, ao deitar-se, o pai ou a mãe contam-lhe uma história. Em certos dias a mãe, ao deitá-la, canta-lhe uma canção muito suave para ela adormecer. Ela considera isto como o melhor presente daquele dia.

Na casa da Rita as pessoas escutam-se umas às outras. Os pais arranjam tempo para ver as coisas que ela faz e elogiam os seus sucessos escolares. Os meus pais, diz o Pedrito, nunca têm tempo para estar comigo. Dão-me muitos presentes para me compensar, mas isso para mim não tem valor. Preferia tê-los comigo.

Em casa da Rita as pessoas têm o hábito de dialogar amigavelmente. Não estão sempre a gritar. Sentem-se livres para dizerem o que pensam, embora haja diferença de opiniões. Por isso a Rita tem grande capacidade de comunicar espontaneamente na escola e nos grupos de amigos.

Os pais da Rita quase sempre têm disposição para acolher os amigos dela. Eis a razão pela qual o Pedrito gosta tanto de ir à casa desta sua amiguinha. Depois, o Pedrito acrescenta com tristeza: mas os meus pais quase nunca têm tempo nem facilitam a vinda dos meus amigos à minha casa. Na opinião do Pedrito a felicidade de uma família edifica-se com pequenas coisas. Ele pensa que a felicidade familiar é mais uma questão de ternura e amor do que de dinheiro.

Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias

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